“Kinds of Kindness” ou “Tipos de Gentileza” leva a virtude do título ao extremo

"Kinds of Kindness" ou "Tipos de Gentileza" leva a virtude do título ao extremo

Emma Stone retorna em nova parceria com o diretor Yorgos Lanthimos, que lhe rendeu um Oscar de melhor atriz no anterior “Pobres criaturas” de 2023.

Por: Vinicius Rodrigues

O novo filme do premiado diretor Yorgos Lanthimos, “Kinds of Kindness” ou “Tipos de Gentileza” segue três histórias diferentes em quase 3h de duração, em capítulos, explorando o mesmo elenco e algumas se entrelaçando, num drama nada convencional, estreia esta semana nos cinemas brasileiros, no dia 22 de outubro e tem classificação de 18 anos.

O elenco do longa é repleto de nomes de peso de Hollywood como Emma Stone, que ganhou o Oscar de melhor atriz com a parceira anterior do diretor Yorgos Lanthimos, em “Pobres Criaturas”, de 2023, Willem Dafoe, quatro vezes indicado ao Oscar, Hunter Schafer da série “Euphoria” e Hong Chau, também indicada ao Oscar por “A baleia” de 2022.

A primeira trama conta a história de um homem que vive pelos mandos e desmandos bizarros do chefe no trabalho, e o diretor explora a comédia do curta com as músicas escolhidas: na abertura toca “Sweet Dreams”, de Eurythmics, e os trechos da canção falam por si só sobre a trama: sobre os abusos e casa perfeitamente com os momentos que o protagonista vive, e termina com “How Deep Is Your Love”, do Bee Gees, depois de uma sequência de assassinato. A música também chega para ilustrar a situação atual dos personagens, sendo embolada por afetos, após um momento de provação humana para saber “quão fundo é o amor entre eles.”

Na segunda narrativa, conta a história de um policial que busca pela esposa desaparecida, mas quando ela retorna, não tem os mesmos costumes e parece que ela foi trocada com outra. Pois, se antes ela odiava chocolate, agora ela ama e o protagonista entra em conflito. Aqui temos cenas gráficas de mutilação, então fica o aviso aos expectadores mais sensíveis. 

E por fim, e não menos importante, temos a trama final de um casal que segue uma seita que envolve culto sexual a beber água da piscina com lagrimas dos charlatões.

As três tramas envolvem os “tipos de gentileza” que carregam no título, seja por uma esposa que a todo custo tenta se integrar ao cotidiano do marido que acha que ela é outra pessoa, e vai ao extremo para provar isso, ou um subordinado que comete crimes esperando receber aprovação do patrão.

Apesar das suas quase 3 horas de duração, o filme tem uma boa fruição, fazendo o expectador acostumado com este tipo de trama mergulhar na história que contém cenas de violência, canibalismo, mutilação e ironia com suas trilhas sonoras.

“Tipos de Gentileza” chega para agradar os cinéfilos que simpatizam com as tramas tradicionais do diretor, que exploram as degradações humanas, como em “Dente canino”, de 2009, “O Lagosta” de 2015 ou “O Sacrifício do cervo sagrado” de 2017, caso contrário, este filme não é para você.

UERJ VIU: 3/5 estrelas

Alien: Romulus: o alienígena está de volta para aterrorizar o espaço mais uma vez

Alien: Romulus: o alienígena está de volta para aterrorizar o espaço mais uma vez

O filme chega com grandes expectativas com a presença do diretor Fede Alvarez na direção 

Por: Vinicius Rodrigues

 

“Alien: Romulus” é a 9ª aparição do alienígena nos cinemas, iniciada com o filme “Alien”, protagonizado e imortalizado pela atriz Sigourney Weaver e o  filme anterior foi o decepcionante “Alien: Covenant”, de 2017. A produção “Alien: Romulus” estreia hoje (15) nos cinemas brasileiros, tem classificação de 16 anos e 1h59 de duração.

Em Romulus, um grupo de jovens trabalhadores infelizes com suas funções almejam trilhar suas vidas em lugar melhor do universo. Eles planejam roubar uma nave para ir à Yvaga, um lugar onde os personagens falam que poderiam ver e sentir o por do sol,  o que eles não esperavam era encontrar uma forma de vida na nave que iria por fim no destino ensolarado deles.

Um dos aspectos positivos do filme é o suspense, como na cena na qual a criatura que solta ácido pelos dentes surge e um personagem está preso no mesmo ambiente. Ou quando o grupo precisa correr por um corredor para chegar a uma porta, como se fosse uma cena da série “Maze Runner”, porém, eles enfrentam um mar de “facehuggers” ao longo do caminho, que saltam em direção às vítimas. Para quem não se lembra, facehugger é o estágio inicial do Alien em que ele eclode do ovo e pula em direção à cara da vítima.

Os efeitos especiais e os efeitos visuais do longa são de outro mundo, pois nos prendem em uma atmosfera claustrofóbica, sem saber o que está por vir. O Alien está mais assustador que nunca.

A química entre a protagonista Rain Carradine, interpretada por Cailee Spaeny do recente “Guerra civil”, que considera o robô Andy, feito pelo ator David Jonsson, “um irmão”, é bem convincente na tela, carregando o drama necessário que os dois protagonizam até chegar nos momentos finais do filme.

Já o resto do elenco é formado por atores desconhecidos, logo não há muita empatia com os seus personagens, nem desenvolvimento dos mesmos, então o que se espera a cada cena é que o Alien os encontre e faço o serviço bem feito para deleite do público. Falando em Alien, é inexistente uma grande ou marcante sequência de perseguição da criatura com as suas vítimas, dando a sensação de desperdício com o material que o diretor tinha em mãos.

O diretor deste novo filme é Fede Alvarez, que também comandou o ótimo remake sangrento do clássico trash dos anos 80 “A morte do demônio”, de 2013. Porém, em Romulus, constata-se que ele economizou nos litros de sangue cenográfico, pois as mortes dos personagens passam despercebidas em meio a uma fotografia escura e tensa, então se você espera um filme gore e que o Alien acabe com quem tropeça em seu caminho, não é aqui.

No fim, “Alien: Romulus” tem mais pontos positivos do que negativos, e entrega um filme à altura do alienígena mais aterrorizante do espaço, com um final que vai chocar os fãs, tanto quanto a cena final de “Prometheus”, de 2012.

UERJ VIU: 3,5/ 5 estrelas

 

Fazendeiros atacam com armas grupos indígenas no MS

Fazendeiros atacam com armas grupos indígenas no MS

Povo Kaiowá-Guarani foram alvo de tiros e vigilância de drones e caminhonetes 

Por: Beatriz Araujo e Manoela Oliveira

Chamada de apoio do povo Kaiowá-Guarani / Fonte: Instagram da Aty Guasu

Centenas de famílias indígenas Guarani Kaiowá têm sofrido ataques armados por fazendeiros e latifundiários após iniciarem a autodemarcação de seu tekoha (“lugar onde se é”, em guarani) no dia 13 de julho. O território, localizado em Douradina, Mato Grosso do Sul (MS), ocupa mais de 9 mil hectares, o equivalente a aproximadamente 35,3% da área total do município. A Assembleia Geral dos Povos Indígenas Guarani e Kaiowá, a Aty Guasu, tem denunciado a situação da comunidade nas redes sociais. Em imagens divulgadas por eles, fazendeiros aparecem ateando fogo no campo, atirando com foguetes e armas de fogo nos indígenas. Além da reivindicação pelo território ancestral, a retomada também visa cessar o despejo de agrotóxicos nas proximidades das residências e das nascentes utilizadas para o consumo de água pelos produtores rurais. 

A retomada denominada Pyaru Yvyajere reinvindica a Terra Indígena Panambi Lagoa Rica, reconhecida em 2011 pelo Governo Federal, mas aguarda desde então a homologação do processo demarcatório. “A gente esperou demais e nada de resposta, então, como comunidade, nós conversamos e chegamos à conclusão de fazer a autodemarcação geral”, conta a indígena Daniela Jorge João. 

Terra Indígena Panambi Lagoa Rica / Fonte: Terras Indígenas no Brasil

Os produtores rurais, no entanto, alegam serem proprietários legais da área e reagiram à situação organizando acampamentos e um cerco de caminhonetes a poucos metros do local da retomada. Em um vídeo gravado por eles, frases em tom de ameaça como “o bambu vai envergar” e “a tropa de choque está chegando” foram veiculadas como forma de ataque à resistência. 

O conflito já deixou mais de 10 indígenas feridos por ataques e disparos de arma de fogo, entre eles um levou um tiro na cabeça e outro no pescoço. Kisa Aquino, indígena também presente na retomada, relata que helicópteros e drones rodam o local para identificar e perseguir os envolvidos na retomada. “A gente sabe que eles soltam os drones em cima da gente porque eles querem ver quantas pessoas, crianças e idosos estão aqui e planejar o ataque. É um terror saber que estamos sendo vigiados e não podemos fazer nada”, completa. 

Agentes do Departamento de Operações de Fronteira (DOF) controlam o acesso à comunidade, fotografando documentos e placas dos veículos, além de coletar informações sobre a retomada, a quantidade de pessoas e as lideranças, segundo o Conselho Indigenista Missionário (CIMI). Para Mônica Cristina Lima, professora da Universidade Indígena Pluriétnica Aldeia Marakanã, a presença do Departamento reprime os indígenas e pessoas de outros movimentos sociais que vão ao local apoiar a retomada. Ela destaca também que o DOF, apesar de ser uma entidade policial da Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública (SEJUSP), tem muita ligação com os latifundiários e isso gera uma desconfiança dos Guarani-Kaiowá com o departamento. “Todas às vezes em que eles retomam uma área, os policiais e os sargentos aposentados que estão presentes nesses grupos de pessoas que os atacam, também estão nas empresas de segurança”.

Resistência dos Guarani-Kaiowá no tekoha 

Cerca de 10 dias após o avanço da autodemarcação, os povos Guarani e Kaiowá receberam uma ordem de despejo dos latifundiários e dos fazendeiros para se retirarem do local em um prazo de cinco dias. Xaky Jovito, indígena presente na retomada, conta que, apesar da ameaça para sair do local, não está com medo, por ter certeza que a comunidade irá lutar pela resistência. “Se isso for acontecer mesmo, a gente vai enfrentar, morrer e se sacrificar pelas nossas terras”. Ela manifesta a preocupação da comunidade de que os ataques dos ruralistas se intensifiquem após o prazo da retirada. “Houve 4 feridos aqui no dia dos ataques, se houver esse despejo, vai ter mais pessoas se ferindo”, completa Xaky. 

Os responsáveis pelos ataques ao povo Guarani-Kaiowá divulgaram informações falsas nas redes sociais, alegando que a comunidade não é indígena e veio do Paraguai. Essas acusações foram feitas por uma fonte anônima em um vídeo publicado na página do Instagram do deputado federal Marcos Pollon. “Os latifundiários falam que a gente é do povo paraguaio, que estamos se fazendo de indígenas, negativo, eu nasci e cresci aqui”, diz Daniela. De acordo com ela, para evitar futuras invasões e violências é necessária a demarcação do tekoha Lagoa Rica, processo em andamento por 20 anos.

Em nota publicada em 20 de julho, a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) e o Ministério dos Povos Indígenas (MPI) afirmaram estar monitorando de perto os povos Guarani e Kaiowá a partir de uma equipe responsável por avaliar a situação e dialogar com as comunidades envolvidas. Após disparos de armas de fogo que resultaram em um indígena baleado e outros machucados com balas de borracha, a Funai busca apoio do Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP). 

A Fundação também recebeu relatos de incêndios de grande escala e de monitoramento da área pelos fazendeiros e latifundiários com drones e caminhonetes. A Funai ressaltou seu objetivo em garantir segurança para os povos originários e em encontrar uma resolução para a retomada com todos os grupos envolvidos. 

Com a retirada das Forças Nacionais do local, em 3 de agosto, os ataques se intensificaram e cinco indígenas foram levados para emergência depois de disparos por armas de fogo. Na tarde da última segunda-feira (05), após mais de três semanas de conflitos entre latifundiários e povos indígenas no MS, o Tribunal Regional Federal da 3° Região (TRF3) suspendeu a ordem reintegração de posse, responsável por ordenar o despejo das comunidades Guarani e Kaiowá na região de Douradina. A suspensão da ordem, porém, não garante a segurança dos indígenas na retomada. “É preciso avançar nas demarcações como nos garante a Constituição Federal”, destaca Mônica Cristina. 

Segundo dados da Funai, até o momento, apenas 424 terras indígenas foram oficialmente demarcadas, representando menos de 14% do território brasileiro. No Brasil, embora o processo demarcatório tenha um número máximo de dias estipulado para cada etapa, a realidade está distante do previsto em lei. Um exemplo disso é o caso dos Guarani-Kaiowá, que aguardam desde 2011 a aprovação da demarcação de seu território.

Etapas no processo de demarcação / Fonte: Instituto Socioambiental

Mesmo com a criação do MPI pelo presidente Lula em 2023 e a nomeação de lideranças indígenas em cargos importantes, como Joênia Wapichana na presidência da Funai, a lentidão nos processos demarcatórios dificultam o avanço na garantia direitos indígenas previstos na constituição. “É uma questão preocupante porque na luta pela terra, 70% dos que estão debaixo de uma lona são crianças e mulheres. Elas estão na linha de frente correndo todo tipo de violações e risco.”, destaca a professora Mônica Cristina.

Em 2023, foram registrados 309 casos de invasões possessórias, exploração ilegal de recursos naturais e outros conflitos relacionados à terra, conforme dados do CIMI. “O problema maior não é a legislação, pois a Constituição nos garante os direitos, mas como garantir e fazer valer esses direitos?”, questiona Mônica. Ela destaca que os interesses e a pressão da bancada ruralista, formada por parlamentares que são, em sua maioria, proprietários de terras e empresários rurais, possuem relação direta com o atraso nos processos de demarcação de terras indígenas. 

O relatório do CIMI mostra que houve um aumento crescente contra os povos originários entre os anos de 2019 e 2022. Durante esses quatro anos, foram registrados 795 indígenas mortos, 407 disputas por conflitos territoriais e cerca de 1133 casos de invasões possessórias, danos ao patrimônio e exploração ilegal de recursos naturais em terras indígenas. No Brasil, não ocorre punição para crimes contra as comunidades originárias, porque há uma conveniência do Estado, afirma Mônica. A professora apontou a organização “Invasão Zero” como um exemplo da impunibilidade desses criminosos, esse movimento é liderado por fazendeiros e proprietários de terra. O grupo é responsável por se organizar ilegalmente para ocupar áreas de trabalhadores de terras e de comunidades indígenas, com características semelhantes às milícias armadas. 

Desafios na demarcação de terras indígenas 

O Marco Temporal é uma tese jurídica criada com objetivo de restringir o direito de posse dos indígenas apenas às terras ocupadas ou disputadas antes de 5 de outubro de 1988, a data de publicação da Constituição vigente no Brasil. A proposta cria barreiras adicionais de demarcação de terras indígenas e aumenta os casos de violência contra essas comunidades, segundo Mônica Cristina. Para ela, o Marco Temporal, que tramita no Supremo Tribunal Federal (STF) desde 2007, pode intensificar os conflitos entre povos originários e grupos dedicados à mineração e ao agronegócio. 

Entre os principais defensores do Marco estão parlamentares que compõem a bancada ruralista, afirmando que o projeto é necessário para dar “segurança jurídica” aos fazendeiros. Nunes Marques, ministro do STF, declara que a soberania do Brasil estaria em risco sem a aprovação do Marco Temporal, além de prejudicar o mercado imobiliário. De acordo com a professora, a tese jurídica é uma “ameaça significativa aos direitos e à integridade territorial das comunidades indígenas”, não reconhecendo terras ocupadas e protegidas por esses povos após 1988. 

O STF considerou o Marco Temporal inconstitucional em setembro de 2023, por validar ameaças e violências ocorridas contra os indígenas antes da proclamação da Constituição. Porém, o Congresso Nacional restabeleceu a proposta com a criação da lei 14.701/2023, negando o pedido de veto feito pelo presidente Lula.  

Para a professora Mônica, a sociedade civil, as comunidades internacionais e os órgãos públicos são responsáveis por determinar o futuro dos povos indígenas na promoção de inclusão social e de visibilidade. Ela conta que as invasões de terras e os casos de violência vão aumentar ou persistir nos próximos anos, sendo as mudanças climáticas e o desmatamento fatores de riscos contra essas comunidades. “Os modos de vida e cosmovisões dos povos originários e seu respeito e conexão com a Mãe Terra, a Grande Criadora, são a alternativa para solucionarmos os desafios climáticos que estamos sofrendo”, conclui a professora.  

Pontos de acolhimentos de alimentos e mantimentos / Fonte: Instagram da Aty Guasu

Desde o início da invasão, os fazendeiros estabeleceram acampamentos nas terras dos Guarani-Kaiowá, impedindo o acesso à comida e água para esses povos. As comunidades indígenas estão instalando pontos de coleta de alimentos e de itens de higiene, como papéis higiênicos e absorventes, para os residentes de Mato Grosso do Sul. Qualquer quantia pode ser doada através do endereço Pix: ms.unidadepopular@gmail.com

Deadpool & Wolverine: a grande aposta do ano da Marvel

Deadpool & Wolverine: a grande aposta do ano da Marvel

Filme estreou na última quinta-feira (25/07) e arrecadou o equivalente a R$ 1,3 bilhão ao redor do mundo na estreia

Por: Davi Guedes

Deadpool & Wolverine é o alvorecer de uma nova era criativa para a produção do Universo Cinematográfico da Marvel (UCM). No entanto, apesar dos novos ares, abdicar dos paradigmas e vícios que a Marvel integrou nas suas produções desde o início de sua quarta fase não parece estar no radar do estúdio, embora esses mesmos sejam o alvo de crítica no próprio longa.

O principal aspecto da história é o caráter anti-heroico dos protagonistas do filme e ele usa dessa característica para constituir a narrativa e a temática. Em resumo, a história consiste na jornada de Deadpool para substituir o Wolverine, o mesmo que morreu no filme “Logan”, a fim de estabilizar a sua realidade e evitar com que ela colapse. 

A trama é, como já esperado, recheada de “fanservices”, e encare isso como uma faca de dois gumes. Por um lado, aos saudosistas de plantão, ver tantos rostos antigos retornarem será gratificante, por outro, o volume desse artifício de roteiro é tamanho que ele parece ser o elemento principal de todo o filme.

Encontra-se aí o aspecto cínico da autocrítica feita no filme pela Marvel: ao mesmo tempo que a obra tira sarro com o estado atual do estúdio, ela ainda depende dos seus vícios para se sustentar. Embora exista uma trama por trás da obra, esta é mais um plano de fundo para um filme preocupado, sobretudo, em agradar ao público.

Perpassa pela obra um metacomentário central: a noção de que mesmo pessoas problemáticas e quebradas podem ser “heróis”, posto que em uma das cenas finais, ambos os protagonistas sacrificam-se pelo bem maior, ao clássico estilo do super-herói virtuoso, ainda que sejam indivíduos muito problemáticos. A transmissão dessa mensagem adquire seu valor pleno se o espectador já tiver assistido aos longas anteriores dos personagens, ou ao menos tiver alguma boa familiaridade com eles, pois o filme em si não gasta muito tempo ou esforços desenvolvendo neles esses aspectos temáticos. Ele depende principalmente de algo que já estaria latente nos personagens, oriundo do desenvolvimento que herdam dos seus filmes predecessores.

Em relação ao humor, espere pelo filme com o humor mais vulgar e ousado da Marvel. O contraste entre um universo tipicamente infanto-juvenil com o Deadpool, um personagem de humor adulto, entrega momentos engraçados. No geral, o filme é genuinamente divertido, apesar da repetição de um modelo de piada e a necessidade de reconhecer as referências feitas com o próprio UCM e com a cultura pop para extrair sentido de várias delas. 

Em relação à trilha sonora, o filme aglutina grandes nomes do pop, como Madonna e Avril Lavigne, que sempre acompanham momentos de ação. 

O saldo final é de uma continuação do que a Marvel vem sendo. A quem se acostumou com a fase quatro, espere um filme com uma montagem e estilo semelhantes, com o diferencial de que esse filme é consciente do que ele é, e, a despeito de tudo, permanece sendo uma continuidade do que a Marvel se acostumou a fazer.

Corrida pelo ESG estimula fraude entre as empresas

Corrida pelo ESG estimula fraude entre as empresas

Discursos de sustentabilidade socioambiental convive com denúncias da prática de greenwashing (lavagem verde) 

Por: Beatriz Araujo

A urgência do debate sobre mudanças climáticas e crises ambientais levou muitas empresas nos últimos anos a adotarem uma estratégia conhecida mundialmente pela sigla em inglês ESG (Meio Ambiente, Social e Governança). A ESG reúne um conjunto de princípios e ações focadas em promover boas práticas. Esforço para se apresentarem como instituições preocupadas com o desenvolvimento responsável, contudo, tem sido acompanhado de denúncias sobre discursos sustentáveis que não correspondem a ações efetivas de mudanças no modo de produção e circulação das empresas. Conhecido como greenwashing, ou seja, a ação de enganar investidores e consumidores, a prática pode ser considerada crime ambiental e ter consequências legais contra empresas, segundo especialistas.

O ESG surgiu em 2004, no relatório da Organização das Nações Unidas (ONU) intitulado “Who Cares Wins” (“Ganha quem se importa”, em português). O documento foi criado para estabelecer diretrizes que buscam determinar se uma empresa é socialmente consciente, sustentável e possui uma gestão adequada. O professor Carlos Milani do Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (IESP-UERJ), explica que o ESG é uma maneira de avaliar o desempenho de sustentabilidade de um negócio, baseando-se em três pilares: Ambiental, Social e Governança. “Essa sigla é uma nova etiqueta para algo anterior, que é essa dinâmica das empresas voluntariamente afirmarem que respeitam os direitos climáticos, ambientais, sociais, e a transparência em suas práticas, gestão de fornecedores e modo de produção de seus produtos e serviços.”

ESG está relacionado às práticas ambientais, sociais e de governança / Foto: Freepik

O pilar Ambiental avalia quais impactos ambientais as organizações promovem, tanto positivamente quanto negativamente. O pilar compreende as ações da empresa voltadas para o meio ambiente, abrangendo comportamentos relacionados ao consumo de recursos naturais em sua cadeia de produção, emissões de gases poluentes e do efeito estufa, eficiência energética, gestão de resíduos, poluição da água, entre outros. O Ambiental considera também ações, projetos e políticas de promoção a preservação e melhoramento ambiental. 

No pilar Social, é avaliado o relacionamento de uma empresa com fatores sociais como a inclusão, a diversidade, relações de trabalho com seus fornecedores e clientes, respeito aos direitos humanos e às leis trabalhistas. Um exemplo são as  condições do local de trabalho que fornecem respeito pela saúde e segurança dos funcionários. O último pilar, de Governança, refere-se às esferas administrativas e de gestão da empresa como a política de remuneração dos cargos, transparência e ética da instituição.

O peso do ESG repercute nos negócios e na imagem das instituições. Os indicadores Ambiental, Social e Governança já são utilizados por empresas de investimento para ajudar a identificar corporações posicionadas para um forte desempenho a longo prazo. De acordo com a pesquisa “ESG Market Navigator”, conduzida pela Bloomberg Intelligence, 84% dos executivos entrevistados acreditam que os fatores ESG contribuem para uma estratégia corporativa mais sólida, melhoram a reputação da empresa e facilitam o acesso a capital e expressam interesse em investimentos sustentáveis. Além disso, à medida que a consciência ambiental e social cresce, os consumidores estão cada vez mais atentos às escolhas das marcas que irão consumir, preferindo produtos mais sustentáveis.

A certificação de ESG em empresas é realizada por certificadoras especializadas do próprio setor de mercado, baseando-se no princípio de que a maioria das práticas e soluções são adotadas voluntariamente, mas, para o professor Carlos Milani, é preciso atenção ao grau de autonomia e independência dos certificadores. “Existem inúmeras denúncias dentro do setor corporativo, sobretudo transnacional, de empresas e corporações que se dizem agentes de acordo com os critérios de ESG ou de responsabilidade socioambiental, mas é um agente que pratica violações de direitos humanos e uma série de práticas que são muito degradantes do ponto de vista socioambiental”, observa.

Algumas práticas não são tão sustentáveis quanto parecem

Além do problema da independência dos certificadores, muitas empresas passaram a praticar uma espécie de “lavagem verde” ou “maquiagem verde”, o greenwashing. Esse tipo de fraude corresponde em adotar uma série de estratégias para tentar construir uma imagem favorável de produtos e serviços que são vendidos como sustentáveis e socialmente responsáveis quando, na verdade, são fruto de um processo de práticas que não atende critérios de mitigação de impactos socioambientais.

“Lave o seu crime climático” / Foto: Istock

A lista dos “Sete Pecados do Greenwashing”, elaborada pela consultoria canadense TerraChoice em 2007, criou uma tipologia das principais práticas de greenwashing que ajuda a identificar melhor práticas problemáticas. Entre elas está a irrelevância. “Por exemplo, você fez um projeto socioambiental com uma comunidade no interior ou na costa do Rio de Janeiro para proteger uma comunidade de marisqueiras, que vivem de manguezal. Mas suas emissões de poluentes estão em uma escala estratosférica, então o que você faz em termos de prática de ESG torna-se irrelevante”, explica Milani. 

A imprecisão e o custo camuflado, como o caso da multinacional Walmart em 2015 onde toalhas e lençóis fabricados com rayon, material sintético foram comercializados como sendo feitos de bambu ecológico, são alguns dos outros fatores presentes na lista. “Existem práticas que correspondem a uma narrativa, a um discurso de ESG. Mas existem também muitas práticas que, infelizmente, dentro do sistema econômico que a gente está inserido não correspondem a esse discurso”, observa o professor.

Em alguns casos, o greenwashing pode ser considerado uma prática ilegal. De acordo com o Código de Defesa do Consumidor (CDC), publicidades enganosas que omitem ou passam informações falsas sobre um produto configuram uma infração. Quando as alegações afetam o meio ambiente, a empresa pode estar sujeita a sanções e multas caso configure descumprimento de leis previstas na legislação brasileira, como a Política Nacional de Resíduos Sólidos, que estabelece diretrizes para a redução, reutilização, reciclagem e tratamento correto desses resíduos no país.

A pesquisa “Mentira Verde” realizada pelo Instituto de Defesa do Consumidor (Idec), além de fornecer dados sobre práticas de greenwashing no mercado brasileiro, apresenta informações úteis para os consumidores que desejam entender e identificar essas práticas no seu consumo pessoal. O guia alerta para o uso de termos como “ecológico”, “sustentável” ou “amigo do meio ambiente”. Termos amplos e vagos como esses não podem ser usados nas embalagens dos produtos de acordo com a Norma ABNT ISO 14021. Outro fator destacado são os selos presentes em embalagens que, muitas vezes, são criados pela própria empresa para passar uma imagem equivocada de certificação. O ideal é que o  consumidor pesquise sobre o símbolo para confirmar sua autenticidade. Dicas como essas mostram a necessidade da cautela diante dos produtos que se encontram no mercado.

Fonte: Ideal Verde

Representação feminina no jornalismo reproduz preconceitos de gênero


Representação feminina no jornalismo reproduz preconceitos de gênero

Levantamento global detalha estigmas e estereótipos enfrentados diariamente pelas mulheres na mídia

Por: Everton Victor e Manoela Oliveira

Foto: Freepik

Seja nas redações, nas assinaturas das matérias, nos editoriais mais “femininos”, até na transmissão da informação existem estereótipos machistas. É o que mostra a pesquisa “Mulheres sem nome”, publicada pela empresa multinacional de comunicação LLYC para analisar a visibilidade feminina na mídia por meio de mais de 14 milhões de matérias. O estudo investigou veículos de comunicação de 12 países, entre eles o Brasil.

Simone Evangelista, professora da Faculdade de Comunicação Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), disse que a disparidade de gênero na cobertura midiática é uma consequência de uma sociedade patriarcal. “O fato das mulheres estarem sempre atribuídas à pouca racionalidade e objetividade é um dos fatores que contribuem para elas terem menos visibilidade no jornalismo”, afirma. 

O estereótipo das mulheres terem menos brilhantismo que os homens também colabora para a desigualdade de gênero, de acordo com Leticia de Oliveira,  coordenadora da Comissão de Equidade da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj). Ela atribui uma série de fatores para esses estigmas, entre eles a falta de mulheres em cargos de liderança. Cerca de 40% dos profissionais de jornalismo são mulheres, mas ocupam apenas 21% dos postos hierárquicos, segundo o relatório do Instituto Reuters realizado em 2022.

Para Marcelle Felix, pesquisadora do Grupo de Estudos Multidisciplinares de Ações Afirmativas (GEMAA), da Uerj, a lógica de pensar comunicação ainda é muito pautada por um olhar masculino, promovendo a sub-representação de mulheres na mídia. Esta realidade é detalhada na pesquisa “Mulheres sem nome”. Ao todo, homens assinam 50% mais notícias que mulheres, sendo a Colômbia o único dos 12 países analisados que tem uma maioria feminina publicando matérias. Marcelle conta que o mercado da comunicação é dominado por um grupo masculino e branco, perpetuando esse cenário.

Essa disparidade entre homens e mulheres vai além das assinaturas, estando também escancarada nas seções dos veículos de comunicação. Os temas que dizem respeito à saúde, à sociedade e aos acontecimentos são mais assinados por mulheres, enquanto os homens publicam mais matérias sobre esporte, economia, tecnologia e ciência, segundo a pesquisa.

Distribuição de gênero entre os temas jornalísticos / Gráfico: Reprodução de Manoela Oliveira, com dados do “Mulheres sem nome”

A linguagem usada no jornalismo pode reproduzir estereótipos, por isso o LLYC apresentou o conceito de “apelido feminino”, que é quando há menção explícita ao gênero em uma matéria, mesmo não sendo esse o foco da notícia. O termo é ligado às mulheres, que sofrem 2,3 vezes mais do que os homens com esse fenômeno. A consequência disso, de acordo com o estudo, é a menor aparição feminina em manchetes e o surgimento de notícias com mulheres sem nome. Simone explica que isso ajuda a fortalecer a invisibilização desse grupo.

A descrição da profissão de uma mulher nas matérias jornalísticas é, por vezes, associada também com questões pessoais, como família e relacionamento. Questionamentos se uma pessoa está solteira, casada ou mesmo divorciada atingem cerca de 40% mais as mulheres do que os homens nas matérias políticas, mostra a pesquisa. 

O portal F5, da Folha de S.Paulo, publicou uma matéria sobre a saída da apresentadora Eliana do SBT. Apesar da carreira musical, da trajetória no entretenimento e dos 15 anos na emissora, o F5 destacou no título um relacionamento da apresentadora na década de 90 e uma fala sobre sua vida sexual.

Reprodução de estereótipos machistas na mídia / Matéria: Folha de S.Paulo

Sobre a forma como a mídia vê as mulheres, também destaca-se outro fator: a aparência. A ex-presidenta do Brasil Dilma Rousseff já foi citada como uma das personalidades que realizaram intervenções estéticas em 2012 pela revista estadunidense “Vanity Fair”. Matérias que analisam a cor, o tamanho da roupa e até mesmo a “mensagem” que se quer passar são mais frequentes nas que se referem a mulheres do que a homens. Uma a cada 25 notícias reflete como a mulher está vestida, de acordo com o levantamento. 

Exemplo de matéria com ênfase na aparência física de uma mulher / Matéria: O Globo

Apesar dos desafios para uma igualdade entre homens e mulheres, a pesquisadora Marcelle é otimista. Para ela, existe um longo caminho para desconstruir vieses machistas na mídia, mas, inevitavelmente, o primeiro passo é debater a composição de quem está pensando a comunicação. Ela defende que sair da sub-representação e estar presente em todos os espaços deve ser um exercício diário, de forma sistemática e não apenas em momentos ocasionais nas empresas.

Moradores das favelas são mais vulneráveis a altas temperaturas

Moradores das favelas são mais vulneráveis a altas temperaturas

Formação de ilhas de calor nas comunidades é uma das causas apontadas por especialista

Por: Manoela Oliveira

Aglomerado de casas das favelas do Complexo do Alemão / Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil
 
 
 

As favelas estão mais expostas a ondas de calor do que lugares considerados nobres, de acordo com um estudo da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). A pesquisa mostrou que os complexos da Maré, do Alemão e da Penha são as regiões mais quentes do Rio de Janeiro, sendo todas áreas localizadas na Zona Norte da cidade. No Rio, a menor temperatura em 2024 foi registrada no Alto da Boa Vista, com 15,5%, segundo o Instituto Nacional de Meteorologia (INMET). As diferenças no tipo de ocupação das regiões da cidade podem explicar as diferenças de temperatura, segundo pesquisadores.

Para Luciana Figueiredo, professora do Departamento de Oceanografia Física e Meteorologia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), a ocorrência de temperaturas mais elevadas em bairros periféricos ocorre, muitas vezes, pela formação de ilhas de calor nessas regiões. Esse fenômeno acontece quando lugares muito urbanizados registram temperaturas mais altas que as áreas ao redor. Isso acontece devido à retirada de cobertura vegetal para construir asfaltos, material com grande absorção de calor. Um estudo global publicado na revista científica Nature Communications revelou que espaços arborizados são até 12 °C mais frios que localidades urbanas sem árvores.

James Miyamoto, professor de arquitetura e urbanismo da UFRJ, explica que existe uma grande aridez nas áreas onde estão localizadas as favelas, intensificando as ilhas de calor. “Quando chove, por exemplo, você tem problemas de alagamento, porque o solo é completamente impermeabilizado”. No Rio de Janeiro, uma em cada cinco casas está em áreas de alto risco de inundação, defende a Associação da Casa Fluminense. 

Distribuição dos cariocas afetados por riscos climáticos / Gráfico: Reprodução própria, com dados da Associação da Casa Fluminense




De acordo com Luciana, “quanto mais carentes são as regiões, menos vegetação a gente vai encontrar”. Um levantamento da Sociedade Brasileira de Arborização Urbana apontou que os bairros da Zona Norte e Oeste do Rio de Janeiro apresentam as menores coberturas vegetais. Cordovil, Santa Cruz e Bangu foram as áreas menos arborizadas da cidade, segundo o estudo.

Luciana ressalta que a precariedade das construções das favelas afeta a sensação climática dos moradores. “Às vezes a casa não tem janela nem portas, então acaba criando um desconforto térmico muito grande nessas pessoas”. A professora concorda com o conceito de “injustiça climática”, argumentando que, apesar de as crises ambientais serem uma realidade global, as pessoas de classes mais altas são menos afetadas pelas mudanças climáticas.

Segundo James, a maioria das moradias nas favelas não possuem telhas, material que reflete os raios solares. No lugar, são usadas lajes em ambientes de grande concentração populacional, contribuindo para o aumento das temperaturas. De acordo com o professor, a melhor forma de diminuir as ondas de calor é com a implementação de cobertura vegetal em pontos estratégicos da cidade. 

Ações da Secretaria Municipal do Meio Ambiente e do Clima

No Rio, a Prefeitura tem projeto para minimizar o impacto das altas temperaturas nas comunidades. O “Cada Favela, uma Floresta”, da Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Clima (SMAC), tem o objetivo de promover o desenvolvimento sustentável no Rio, diminuindo as vulnerabilidades climáticas existentes nas áreas mais pobres nessas regiões. Segundo Alberto Santos, arquiteto e urbanista na Gerência de Projetos Especiais da SMAC, o programa visa ampliar as áreas drenantes, reduzir as ilhas de calor e aumentar o acesso às áreas verdes. No Parque Ecológico da Maré, o “Cada Favela, uma Floresta” trabalha no plantio de mudas e construção de hortas comunitárias. O projeto está em fase de licitação no Complexo do Alemão e no Morro do Juramento.

“Cada Favela, uma Floresta” tem parceria com outros três programas da Secretaria, o primeiro é o “Hortas Cariocas”. Ele é responsável por gerar alimentos de qualidade dentro das comunidades e incentivar os moradores da favela a entrarem em contato com os plantios, de acordo com Alberto. O segundo projeto é o “Cozinha Sustentável”, que ensina a população a preparar esses alimentos, além de oferecer comida à comunidade. O terceiro é o “Guardiões dos Rios”, que difunde nas favelas a conscientização ambiental por meio de eventos sobre sustentabilidade.

Programa Procriar: Promovendo saúde e conhecimento


Programa Procriar: Promovendo saúde e conhecimento

Programa de extensão da Uerj oferece práticas integrativas e oficinas de criação para a comunidade

Por Samira Santos e Julia Lima

Equipe do Procriar / Foto: Reprodução do Instagram

Na Faculdade de Enfermagem da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), um programa de extensão vem promovendo uma abordagem nova na educação e no cuidado com a saúde. Coordenado por Eliane Paquiela, combina práticas integrativas e oficinas de criação, oferecendo uma experiência educacional e terapêutica única para alunos e comunidade. 

Fundado há mais de duas décadas pela professora Célia Caldeira Fonseca Kestenberg, o Procriar teve continuidade com Janaina Mengal Gomes Fabri e Frances Valeria Costa antes de Eliane assumir a coordenação. O programa é multiprofissional e aberto, favorecendo a interação entre diversos projetos de extensão junto com a comunidade.

O Procriar possui duas frentes principais: as práticas integrativas e as oficinas de criação. As práticas integrativas são coordenadas por professores cadastrados e incluem um projeto abrangente chamado “Saúde-se”, que oferece atendimentos à comunidade e diversas terapias integrativas. Além disso, projetos como “Meditação”, a “Liga da Saúde Mental” e o “Quilombo do Cuidar” são partes do Procriar, abordando temas de dança, arte, cultura, raça, gênero, identidade e sexualidade. Essas iniciativas proporcionam aos alunos a oportunidade de explorar essas temáticas de forma prática que vai além de estudar os conceitos na sala de aula. Paquiela destaca a importância de vincular a comunidade à Universidade através dos projetos de extensão. “A gente acredita que uma formação em saúde não é afastada do campo político, com isso pensamos em oportunizar para que a sociedade possa conhecer a Uerj a partir dos nossos projetos.” 

A relação entre a comunidade e o Procriar é um aspecto essencial do programa. Para que um projeto seja caracterizado como extensão, é necessário que haja uma conexão concreta entre a universidade e a comunidade. Isso é facilitado pela Rede 2.2, que organiza o território de saúde no Rio de Janeiro, permitindo a abertura de espaços tanto para os trabalhadores da saúde quanto para a comunidade local. A divisão territorial da cidade em áreas de planejamento e programáticas permite que os serviços de saúde atendam melhor às necessidades locais, seguindo a lógica organizacional do SUS.

Com a nova gestão da Faculdade de Enfermagem, foi criado um colegiado representando todos os departamentos: Fundamentos de Enfermagem, Enfermagem de Saúde Pública, Enfermagem Médico-Cirúrgica e Enfermagem Materno-Infantil. Esse colegiado inclui dois professores de cada departamento, um ligado às práticas integrativas e outro às oficinas de criação. Com essa estrutura, a Faculdade pretende organizar um cronograma anual para melhorar a gestão e a eficácia dos projetos de extensão. 

O Procriar não apenas beneficia a comunidade com suas práticas integrativas e oficinas de criação, mas também oferece aos alunos uma formação completa, integrando conhecimentos teóricos e práticos. Ele reside no endereço Boulevard 28 de Setembro, 157 – Vila Isabel, Rio de Janeiro – RJ, CEP 20551030

Após completar 96 anos, Verde e Rosa está cada vez mais próxima da população do Morro da Mangueira

Após completar 96 anos, Verde e Rosa está cada vez mais próxima da população do Morro da Mangueira

Carnavalesco da Escola conta a importância da Mangueira para a comunidade

Por: Everton Victor e Manoela Oliveira 

 
 
Quadra da Estação Primeira de Mangueira / Reprodução: Agência Brasil

A Estação Primeira de Mangueira comemorou seu aniversário de 96 anos, no último dia 28 de abril. A Escola celebrou com Rodas de Samba Cultural no Palácio do Samba, com a participação de mangueirenses que marcaram a história da “Verde e Rosa”, como Guesinha, neta do primeiro presidente da Mangueira, e Alvinho, integrante da Velha Guarda da Bateria. Além de comemorar quase um centenário, o objetivo da Escola é estimular “a reunião de seus compositores e convidados para cantar e relembrar os grandes sambas dos mestres do passado”, segundo a agremiação.

O legado quase centenário da Mangueira se estende para além da quadra da Escola, que fica no pé do morro da Mangueira. O Museu do Samba, localizado na Rua Visconde de Niterói, mesma rua da quadra da “Verde e Rosa”, é um retrato da memória do samba. Apesar de não ter vínculo administrativo com a Estação Primeira, reforça seu legado, o espaço conta com três exposições: Heróis da Liberdade, A Força feminina no Samba e Zi Cartola, essa última é dedicada ao legado de Cartola e Dona Zica, que contribuíram para a fundação da Escola em 1928. Para Sidnei França, carnavalesco da Mangueira, como um patrimônio da cidade, o Museu do Samba contribui com seus saberes e seus valores para a comunidade.

Museu do Samba / Reprodução: Everton Victor

De acordo com Amanda Cristina, mediadora do Museu, cada exposição explora um tipo de samba: partido alto, terreiro e enredo. “Nós somos o Museu do Samba, nosso objetivo é salvaguardar esse patrimônio em suas mais variadas vertentes, esses espaços não existem nem de, nem por, nem com, nem para o Carnaval, existe Carnaval sem Escola de Samba e existe Escola de Samba sem o Carnaval”, explica.

Segundo Sidnei França, os artistas e artesãos da agremiação possuem a responsabilidade de formar cidadãos conscientes para a comunidade. A Vila Olímpica da Mangueira foi citada por Sidnei como um dos espaços da Escola que contribui para a formação de talentos e para o desenvolvimento social dos jovens. O local oferece gratuitamente atividades esportivas para todas as idades, como ginástica rítmica, futebol e natação. A Vila conta com a inclusão de turmas para pessoas com deficiência (PCD) em diversas modalidades, esses alunos precisam apresentar o laudo médico antes de se matricular. 

Além de quadras, vila olímpica, viadutos e ruas, a história da “Verde e Rosa” e de seus baluartes também está presente em espaços de preservação da própria comunidade. A Mangueira do Amanhã, Escola Mirim do Pavilhão, Programa Social Mangueira, Mangueira do Futuro, Camp Mangueira e Instituto Profissionalizante Mangueira são alguns dos espaços onde a Estação Primeira expande sua atuação para a comunidade, oferecendo atividades educativas, profissionalizantes, esportivas e sociais. 

O simbolismo da agremiação para o morro também está presente na tradição de valorizar componentes que pertencem à comunidade, que se tornou uma marca d a Escola, como a rainha de Bateria Evelyn Bastos, que está há mais de 10 anos no posto. Evelyn também é presidenta da Mangueira do Amanhã e, mais recentemente, diretora cultural da Liga Independente das Escolas de Samba (Liesa). 

Sidnei França acrescenta que a Estação Primeira possui o objetivo de  desenvolver a cidadania na comunidade, promovendo a cultura e a consciência de pertencimento. “As pessoas da Mangueira precisam saber quem elas são, como elas interagem com o mundo pela produção do samba e da arte”, reforça. Ele afirma que o Morro da Mangueira está em um momento de retomar o protagonismo de seu próprio caminho, surgindo uma geração que enfrenta as dificuldades e os preconceitos. A Escola está criando uma geração que acredita na igualdade, na diversidade e no respeito ao outro, segundo o carnavalesco.

Carnavalesco da Mangueira fala sobre o enredo do Carnaval 2025

Carnavalesco da Mangueira fala sobre o enredo do Carnaval 2025

Escola pretende mostrar as consequências da “diáspora negra”

Por: Everton Victor e Manoela Oliveira

Carro Alegórica da Mangueira de 2020 / Reprodução: Tomaz Silva/Agência Brasil
 
 
 
 
 

A Estação Primeira de Mangueira apresentou seu enredo para o próximo carnaval: “À Flor da Terra – No Rio da Negritude entre dores e paixões”, no dia 25 de abril. No dia 14 de maio, a Escola lançou a sinopse do enredo, próximo ao aniversário de 96 anos da escola. O enredo é assinado pelo carnavalesco Sidnei França, que fará sua estreia à frente da “Verde e Rosa” em busca do 21° título da agremiação. 

Para além de homenagear personalidades negras, o carnavalesco reforçou que busca saudar todo um coletivo. Sidnei quer trazer a história e a riqueza da cultura bantu, e como ela está presente no que hoje se nomeia “Pequenas Áfricas”. Nessa trajetória de África para o Brasil, o carnavalesco também explora o Atlântico como um lugar de memória da própria negritude, como o enredo explica. “A água conduz as passagens e é no seu interior que estão guardadas a memória e os mistérios ancestrais”.

O objetivo do enredo é relatar as consequências da diáspora negra, que consistiu na imigração forçada de africanos durante o período escravocrata. Sidnei declara que deseja levar a cultura bantu para a Avenida, pois 75% dos africanos escravizados eram bantus. Os bantus englobam povos que habitavam principalmente a África Subsaariana, nas regiões de Angola, do Congo e do Gabão. 

Capa oficial do enredo da Mangueira / Reprodução: Instagram da escola

De acordo com o carnavalesco, a Estação Primeira possui uma forte herança preta, sendo uma região que dialoga com a cultura bantu. “A gente pode entender que a Mangueira é uma Pequena África, porque foi ocupada por corpos negros que saíram da região central”, afirma. Por isso, o enredo “À Flor da Terra – No Rio da Negritude Entre Dores e Paixões” consegue trazer o protagonismo negro para a Sapucaí, segundo ele.

Para Sidnei, o enredo não irá prestigiar pessoas específicas ao longo do desfile, mas retratar as vivências de corpos negros na cidade do Rio de Janeiro como um todo. O carnavalesco conta que é preciso não apenas “denunciar o preconceito e a violência, mas também exaltar a cultura preta”. O desfile irá homenagear as contribuições do povo bantu, como suas influências linguísticas, musicais e culturais.  

Sidnei também reafirma o protagonismo negro no desfile, principalmente na construção narrativa. “Esse enredo não vai ser mostrado no desfile segundo a visão colonialista, vamos contar pela ótica e visão preta”. A intenção da agremiação é discutir as diferentes formas de apagamento da população negra, desde sua chegada forçada no Cais do Valongo, explorando a cidade como uma extensão do próprio Atlântico.

No próximo ano, as 12 Escolas de Samba do Grupo Especial serão divididas em três noites de desfiles, nos dias 2, 3 e 4 de março. A Mangueira será a última Escola a desfilar no primeiro dia de desfile. O enredo não apenas homenageia a história da Escola, mas também conta como a alma carioca “desafia a morte, celebra a vida e faz carnaval”. 

O templo do samba contará com 10 das 12 Escolas abordando temáticas afro. Diversos recortes que exploram a negritude já foram anunciados no enredo e na explanação da sinopse. O orixá Logun-Edé, a primeira mulher trans não indígena do Brasil, o cantor Milton Nascimento, o sambista Laíla e o primeiro terreiro de candomblé no Brasil são alguns dos enredos que reforçam a diversidade cultural que será trazida para a Avenida.