Clarice Falcão celebra disco “Truque” com turnê pelo Brasil

Clarice Falcão celebra disco “Truque” com turnê pelo Brasil

Quarto álbum de estúdio da cantora explora diferentes ritmos e facetas criativas

Por: Vinícius Feliciano

Lançado em agosto de 2023, o último álbum de Clarice Falcão reflete sobre diferentes visões de um típico relacionamento romântico. Em “Truque”, a cantora adentra ritmos inexplorados em seus outros trabalhos com uma produção cheia de instrumentais de metais, sopro e cordas, assinada por Lucas de Paiva.

Clarice Falcão no clipe da música “Chorar da Boate”. (Foto: divulgação)

Após grandes álbuns de sucesso, como “Problema Meu” e “Monomania”, Clarice Falcão retornou para a música em 2023 com o lançamento de seu álbum visual, “Truque”. Nele, a cantora tenta explorar novas facetas do sentimentalismo humano e do amor. Com o contraste entre canções como “Quero acreditar” e “Podre”, ela reflete sobre suas visões de diferentes pontos da vida. Em entrevista para o UERJ VIU, declarou que “O álbum ‘Truque’ tem uma ideia de iludir e de mostrar como o amor é uma ilusão que escolhemos acreditar”.

Como inspiração para composição de suas letras, Clarice cita que não tem nada em específico que a sirva de inspiração para as músicas, no entanto, reitera que todas as coisas que consome e situações que vivencia em sua vida são o que dão gás para sua criatividade.

Em parceria com Lucas Cunha e inspirações de “Corra!” (Jordan Peele) e “Sob a pele” (Jonathan Glazer), os clipes do álbum carregam uma aura fora da realidade, com um fundo preto e sem grandes detalhes para contornar a realidade em um efeito de cenário infinito. “Cada vídeo dá uma rasteira no público”, afirma Clarice ao exemplificar a forma de como os vídeos foram gravados, buscando brincar com a realidade. Em “Ar da sua graça”, por exemplo, a protagonista aparece submersa e cercada de peixes, no entanto, a gravação foi feita com um aquário entre a câmera e Clarice, gerando o efeito.

Videoclipe da música “Ar da sua graça”. (Foto: Clipe/Youtube)

Com casa esgotada, a Turnê Truque teve sua estreia em 01/03 na Casa Natura, em São Paulo. O show foi composto por diversos efeitos práticos que divertiram o público e cravaram a estética do álbum. Clarice afirma que todas as etapas de criação foram incrivelmente pensadas, inclusive as da turnê, pois queria entregar um trabalho completo em todas as áreas. “Mesmo não sendo um trabalho de 1 milhão de reais, usei toda a criatividade para surpreender o público”, afirma.

A Turnê Truque possui duas datas marcadas: 11/05 no Teatro Claro Mais Rio, no Rio de Janeiro, e no dia 17/05 no Bar Opinião, em Porto Alegre. Novas datas ainda serão anunciadas. Os ingressos para as datas agendadas podem ser comprados clicando aqui. O álbum musical “Truque” pode ser reproduzido em todas as plataformas digitais.

 
 
 

Unreal Unearth: uma odisseia

Unreal Unearth: uma odisseia

Em seu terceiro álbum de estúdio Hozier combina música e literatura através dos Nove Círculos do Inferno de Dante

Por: Beatriz Araujo

 

 

Andrew Hozier-Byrne, o irlandês dono do hit “Take Me To Church”, que dominou as paradas em 2014, é conhecido por explorar uma fusão de estilos musicais, incluindo blues, folk, R&B e rock. Seu álbum mais recente, intitulado “Unreal Unearth”, lançado em 18 de agosto de 2023, conta com 16 faixas que refletem experiências do cantor durante o período pandêmico em 2020. O álbum aborda temas como cultura, amor e sociedade, além de incorporar elementos culturais irlandeses com ditos populares e versos cantados em gaélico.

Em entrevista para o Grammy, Hozier revelou que encontrou grande parte da inspiração para seu trabalho em “Inferno”, a primeira parte do poema épico “A Divina Comédia” do italiano Dante Alighieri. Esta obra descreve a jornada do poeta pelos Nove Círculos do Inferno, onde cada círculo representa um pecado e uma punição progressivamente mais severa. A narrativa oferece uma representação alegórica da vida após a morte conforme estabelecido pelas crenças cristãs. É em torno dessa jornada poética e recheada de simbologias que Hozier estrutura seu álbum.

Capa do álbum ‘Unreal Unearth’. (Foto: Reprodução/ Spotify)

Em “Unreal Unearth”, os círculos são representados por agrupamentos de músicas com ideias e símbolos presentes no Inferno de Dante. Um exemplo disso é “Francesca”, single de estreia do álbum, que conta a história real do caso da nobre italiana Francesca de Rimini com Paolo Malatesta, irmão de seu marido. No poema, ela e o amado habitam o Vale dos Ventos onde as almas que se entregaram à luxúria e ao adultério são atormentadas por turbilhões de vento sem fim. Embora a história de Paolo e Francesca seja vista como um pecado lascivo, Hozier redefine a narrativa e enfatiza a devoção duradoura ao parceiro em meio aos momentos difíceis quando canta “Eu não mudaria nada / O paraíso não é adequado para abrigar um amor como você e eu”, explorando o tema do amor e compromisso.

As faixas “De Selby (Part 1)” e “De Selby (Part 2)” compõem a abertura do álbum e representam a descida ao submundo. A transição entre as duas músicas é imperceptível, enquanto em um tom misterioso e reconfortante, a voz de Hozier faz um convite ao ouvinte cantando sobre a busca por significado em meio a escuridão e o vazio 

O primeiro círculo, Limbo, é apresentado na terceira faixa, “First Time”. Embora possa ser vista como uma canção de amor, ela carrega também temas como o desejo de sobrevivência e reencarnação. O álbum também mescla algumas referências da mitologia grega ao Inferno de Dante, como o Rio Lete mencionado em “First Time”, o mito de Ícaro em “I, Carrion (Icarian) e em títulos como “Son of Nyx” e “Abstract (Psychopomp)”.

“Eat Your Young” está inserida no terceiro círculo do Inferno e faz referência ao panfleto satírico de Jonathan Swift, “Uma Modesta Proposta”. A letra é escrita sob a perspectiva de um narrador não confiável e tece críticas à ganância capitalista e corporativa. Composta de versos como “Migalhas não são para todos/ Velhos e jovens são bem-vindos à refeição”, “Esfolar as crianças por um tambor de guerra / Colocar comida na mesa, vender bombas e armas / É mais rápido e fácil comer os seus jovens”, é uma faixa que aborda questões sociais como a desigualdade e apatia social, tanto em períodos antigos quanto mais recentes.

Hozier e Ivanna Sakhno no videoclipe de ‘Eat Your Young’ (Foto: Reprodução/ Youtube)

“Damage Gets Done” é a única faixa colaborativa do álbum, com Brandi Carlile, e vem logo depois de “Eat You Young”, como uma resposta da geração mais jovem ao ser sempre julgada como culpada pelo estado negativo da sociedade em um mundo no qual não têm poder.

No sétimo círculo do Inferno, “Butchered Tongue” (“Língua Massacrada”, em tradução livre) representa a violência contra o próximo. A letra expõe a brutalidade infligida aos rebeldes irlandeses pelas forças inglesas durante a Rebelião de Wexford, em 1798, onde orelhas foram cortadas como uma forma de punição e intimidação. A canção também reflete sobre a violência linguística que ocorreu durante o período, em versos como: “Sem nenhum tradutor para soar / Uma língua massacrada ainda cantando aqui acima do solo”. Hozier também resgata o idioma irlandês cantando trechos em gaélico em “De Selby (Part 1)” e “To Someone From A Warm Climate (Uiscefhuarithe)”, tornando-se uma voz poderosa para aqueles que foram silenciados e oprimidos ao longo da história.

“Anything But”, décima terceira faixa do álbum, é uma das mais divertidas e interessantes. Em um primeiro momento, ela soa como uma canção de amor, inocente e apaixonada, no entanto, é repleta de frases enigmáticas que revelam o desejo de se afastar de alguém. A música está inserida no oitavo círculo do Inferno, a fraude. Um exemplo é quando Hozier canta: “Se eu tivesse o trabalho dele, você viveria para sempre”, o ele a quem está se referindo é a morte, e ao relacionar o verso com o contexto de Inferno “viver para sempre” significaria um eterno tormento.

Encerrando o álbum, a décima sexta faixa “First Light”, simboliza o fim da jornada pelo Inferno, a saída das trevas para ver a luz novamente. O trecho “E mal consigo acreditar no que estou acreditando/ Poderia ser assim que todos os dias começam?” transmite a sensação de esperança, a expectativa do recomeço após as experiências vividas e assegura a efemeridade das dificuldades que enfrentamos ao longo da jornada que chamamos de vida. 

Com mensagens atemporais que inspiram reflexões sobre o mundo e a sociedade que o compõe, a habilidade de Hozier em entrelaçar suas composições à literatura, utilizando-a para contar uma história que abraça diversas temáticas, confere à “Unreal Unearth” um caráter fascinante e extraordinariamente poético.