Após completar 96 anos, Verde e Rosa está cada vez mais próxima da população do Morro da Mangueira

Após completar 96 anos, Verde e Rosa está cada vez mais próxima da população do Morro da Mangueira

Carnavalesco da Escola conta a importância da Mangueira para a comunidade

Por: Everton Victor e Manoela Oliveira 

 
 
Quadra da Estação Primeira de Mangueira / Reprodução: Agência Brasil

A Estação Primeira de Mangueira comemorou seu aniversário de 96 anos, no último dia 28 de abril. A Escola celebrou com Rodas de Samba Cultural no Palácio do Samba, com a participação de mangueirenses que marcaram a história da “Verde e Rosa”, como Guesinha, neta do primeiro presidente da Mangueira, e Alvinho, integrante da Velha Guarda da Bateria. Além de comemorar quase um centenário, o objetivo da Escola é estimular “a reunião de seus compositores e convidados para cantar e relembrar os grandes sambas dos mestres do passado”, segundo a agremiação.

O legado quase centenário da Mangueira se estende para além da quadra da Escola, que fica no pé do morro da Mangueira. O Museu do Samba, localizado na Rua Visconde de Niterói, mesma rua da quadra da “Verde e Rosa”, é um retrato da memória do samba. Apesar de não ter vínculo administrativo com a Estação Primeira, reforça seu legado, o espaço conta com três exposições: Heróis da Liberdade, A Força feminina no Samba e Zi Cartola, essa última é dedicada ao legado de Cartola e Dona Zica, que contribuíram para a fundação da Escola em 1928. Para Sidnei França, carnavalesco da Mangueira, como um patrimônio da cidade, o Museu do Samba contribui com seus saberes e seus valores para a comunidade.

Museu do Samba / Reprodução: Everton Victor

De acordo com Amanda Cristina, mediadora do Museu, cada exposição explora um tipo de samba: partido alto, terreiro e enredo. “Nós somos o Museu do Samba, nosso objetivo é salvaguardar esse patrimônio em suas mais variadas vertentes, esses espaços não existem nem de, nem por, nem com, nem para o Carnaval, existe Carnaval sem Escola de Samba e existe Escola de Samba sem o Carnaval”, explica.

Segundo Sidnei França, os artistas e artesãos da agremiação possuem a responsabilidade de formar cidadãos conscientes para a comunidade. A Vila Olímpica da Mangueira foi citada por Sidnei como um dos espaços da Escola que contribui para a formação de talentos e para o desenvolvimento social dos jovens. O local oferece gratuitamente atividades esportivas para todas as idades, como ginástica rítmica, futebol e natação. A Vila conta com a inclusão de turmas para pessoas com deficiência (PCD) em diversas modalidades, esses alunos precisam apresentar o laudo médico antes de se matricular. 

Além de quadras, vila olímpica, viadutos e ruas, a história da “Verde e Rosa” e de seus baluartes também está presente em espaços de preservação da própria comunidade. A Mangueira do Amanhã, Escola Mirim do Pavilhão, Programa Social Mangueira, Mangueira do Futuro, Camp Mangueira e Instituto Profissionalizante Mangueira são alguns dos espaços onde a Estação Primeira expande sua atuação para a comunidade, oferecendo atividades educativas, profissionalizantes, esportivas e sociais. 

O simbolismo da agremiação para o morro também está presente na tradição de valorizar componentes que pertencem à comunidade, que se tornou uma marca d a Escola, como a rainha de Bateria Evelyn Bastos, que está há mais de 10 anos no posto. Evelyn também é presidenta da Mangueira do Amanhã e, mais recentemente, diretora cultural da Liga Independente das Escolas de Samba (Liesa). 

Sidnei França acrescenta que a Estação Primeira possui o objetivo de  desenvolver a cidadania na comunidade, promovendo a cultura e a consciência de pertencimento. “As pessoas da Mangueira precisam saber quem elas são, como elas interagem com o mundo pela produção do samba e da arte”, reforça. Ele afirma que o Morro da Mangueira está em um momento de retomar o protagonismo de seu próprio caminho, surgindo uma geração que enfrenta as dificuldades e os preconceitos. A Escola está criando uma geração que acredita na igualdade, na diversidade e no respeito ao outro, segundo o carnavalesco.

Carnavalesco da Mangueira fala sobre o enredo do Carnaval 2025

Carnavalesco da Mangueira fala sobre o enredo do Carnaval 2025

Escola pretende mostrar as consequências da “diáspora negra”

Por: Everton Victor e Manoela Oliveira

Carro Alegórica da Mangueira de 2020 / Reprodução: Tomaz Silva/Agência Brasil
 
 
 
 
 

A Estação Primeira de Mangueira apresentou seu enredo para o próximo carnaval: “À Flor da Terra – No Rio da Negritude entre dores e paixões”, no dia 25 de abril. No dia 14 de maio, a Escola lançou a sinopse do enredo, próximo ao aniversário de 96 anos da escola. O enredo é assinado pelo carnavalesco Sidnei França, que fará sua estreia à frente da “Verde e Rosa” em busca do 21° título da agremiação. 

Para além de homenagear personalidades negras, o carnavalesco reforçou que busca saudar todo um coletivo. Sidnei quer trazer a história e a riqueza da cultura bantu, e como ela está presente no que hoje se nomeia “Pequenas Áfricas”. Nessa trajetória de África para o Brasil, o carnavalesco também explora o Atlântico como um lugar de memória da própria negritude, como o enredo explica. “A água conduz as passagens e é no seu interior que estão guardadas a memória e os mistérios ancestrais”.

O objetivo do enredo é relatar as consequências da diáspora negra, que consistiu na imigração forçada de africanos durante o período escravocrata. Sidnei declara que deseja levar a cultura bantu para a Avenida, pois 75% dos africanos escravizados eram bantus. Os bantus englobam povos que habitavam principalmente a África Subsaariana, nas regiões de Angola, do Congo e do Gabão. 

Capa oficial do enredo da Mangueira / Reprodução: Instagram da escola

De acordo com o carnavalesco, a Estação Primeira possui uma forte herança preta, sendo uma região que dialoga com a cultura bantu. “A gente pode entender que a Mangueira é uma Pequena África, porque foi ocupada por corpos negros que saíram da região central”, afirma. Por isso, o enredo “À Flor da Terra – No Rio da Negritude Entre Dores e Paixões” consegue trazer o protagonismo negro para a Sapucaí, segundo ele.

Para Sidnei, o enredo não irá prestigiar pessoas específicas ao longo do desfile, mas retratar as vivências de corpos negros na cidade do Rio de Janeiro como um todo. O carnavalesco conta que é preciso não apenas “denunciar o preconceito e a violência, mas também exaltar a cultura preta”. O desfile irá homenagear as contribuições do povo bantu, como suas influências linguísticas, musicais e culturais.  

Sidnei também reafirma o protagonismo negro no desfile, principalmente na construção narrativa. “Esse enredo não vai ser mostrado no desfile segundo a visão colonialista, vamos contar pela ótica e visão preta”. A intenção da agremiação é discutir as diferentes formas de apagamento da população negra, desde sua chegada forçada no Cais do Valongo, explorando a cidade como uma extensão do próprio Atlântico.

No próximo ano, as 12 Escolas de Samba do Grupo Especial serão divididas em três noites de desfiles, nos dias 2, 3 e 4 de março. A Mangueira será a última Escola a desfilar no primeiro dia de desfile. O enredo não apenas homenageia a história da Escola, mas também conta como a alma carioca “desafia a morte, celebra a vida e faz carnaval”. 

O templo do samba contará com 10 das 12 Escolas abordando temáticas afro. Diversos recortes que exploram a negritude já foram anunciados no enredo e na explanação da sinopse. O orixá Logun-Edé, a primeira mulher trans não indígena do Brasil, o cantor Milton Nascimento, o sambista Laíla e o primeiro terreiro de candomblé no Brasil são alguns dos enredos que reforçam a diversidade cultural que será trazida para a Avenida.