Projeto Quilombo Cuidar realiza terceiro seminário na Uerj 

 Projeto Quilombo do Cuidar realiza terceiro seminário na Uerj 

O projeto de extensão  discutiu  questões com foco na saúde da mulher negra

Por: Maria Eduarda Galdino

Estudantes de enfermagem e integrantes do Quilombo cuidar (Foto: agência Garagem 293)

 

“É cuidar dos outros para além da doença”, essas foram as palavras da estudante de enfermagem da Uerj Thayssa Vitoria Mattos da Silva sobre o Quilombo do Cuidar, projeto de extensão da Faculdade de Enfermagem (FACENF/ Uerj), criado pela professora Roberta Geórgia, coordenadora de graduação da FACENF.  O projeto tem por objetivo cuidar da saúde da população negra e quilombola e expor pautas antirracistas para um público de todas as idades, com aulas e eventos. 

A terceira edição do seminário Quilombo do Cuidar aconteceu no dia 12 de junho, tendo como foco principal a discussão sobre saúde mental da mulher preta. O evento contou com a participação de artistas, enfermeiras, assistentes sociais e professores.

Nas mesas de debate, cada palestrante contou sobre seus projetos, dissertações acadêmicas e vivências como mulheres negras. As histórias relatadas abordaram os obstáculos de viver em sociedade como pessoa negra e como a qualidade de vida e saúde mental são difíceis de se manterem estáveis por conta das violências e falta de suporte do Estado. Mas, apesar das dificuldades contadas, cada palestrante mostrou alternativas de como a comunidade negra pode se ajudar e cuidar, por meio de movimentos que têm como propósitos a coletividade, resistência e o cuidado.

Palestrantes do seminário (Foto: agência Garagem 293)
 

Helaine Maria, uma das palestrantes, falou sobre a sua vivência como enfermeira, que diariamente cuida de pessoas negras que sofrem violência, racismo e abandono nas clínicas de saúde. “Eu recebo essas mulheres lá na maternidade,  muitas delas  em situação de rua que vêm para parir, então como a gente olha essa mulher ? Qual o cuidado ?”, diz Helaine. 

A enfermeira vê a solidariedade e o cuidado como alternativas para a mudança do cenário de violência. Ela afirma que é preciso lutar, escrever, brigar e se unir para combater as violências vividas por mulheres negras. 

 A estudante de enfermagem Thayssa Vitoria, que está no segundo período do curso e que faz parte do projeto de extensão Quilombo do cuidar, contou a experiência dela como mulher negra e como eventos como o seminário são de extrema importância para a sociedade. “Se a Thayssa de 15 anos tivesse frequentado um evento desse, teria me poupado muitos anos de terapia e sofrimentos. É uma questão de representatividade, nesse evento a gente consegue se identificar e perceber que a gente não está sozinha nesse mundo”. 

A estudante ressalta que as mulheres negras ainda não alcançaram posições de protagonismo suficientes. Thayssa afirma que ainda faltam espaços voltados para pessoas negras, que tentam mascarar uma ideia de inclusão, quando na verdade, as mulheres negras ainda não estão presentes nos cargos de protagonismo e de liderança na sociedade. “Quantas médicas pretas você conhece ? Quantas juízas e advogadas pretas você conhece? Quantas coordenadoras de graduação e professoras de mestrado pretas você conhece? Por que não dar o poder a uma mulher negra? A gente ainda tem muito a conquistar e avançar, é uma luta que a gente não vai abrir mão”.

Mais informações  sobre o Quilombo do Cuidar podem ser acessadas nas redes sociais do projeto:  @quilombodocuidar 

Patrocinadores: @uerj.oficial @Fenf_uer  @Prefc_smsrio @socioedunaras @liasmeuerj @procriaruer 

 

 

  

Programa Procriar: Promovendo saúde e conhecimento


Programa Procriar: Promovendo saúde e conhecimento

Programa de extensão da Uerj oferece práticas integrativas e oficinas de criação para a comunidade

Por Samira Santos e Julia Lima

Equipe do Procriar / Foto: Reprodução do Instagram

Na Faculdade de Enfermagem da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), um programa de extensão vem promovendo uma abordagem nova na educação e no cuidado com a saúde. Coordenado por Eliane Paquiela, combina práticas integrativas e oficinas de criação, oferecendo uma experiência educacional e terapêutica única para alunos e comunidade. 

Fundado há mais de duas décadas pela professora Célia Caldeira Fonseca Kestenberg, o Procriar teve continuidade com Janaina Mengal Gomes Fabri e Frances Valeria Costa antes de Eliane assumir a coordenação. O programa é multiprofissional e aberto, favorecendo a interação entre diversos projetos de extensão junto com a comunidade.

O Procriar possui duas frentes principais: as práticas integrativas e as oficinas de criação. As práticas integrativas são coordenadas por professores cadastrados e incluem um projeto abrangente chamado “Saúde-se”, que oferece atendimentos à comunidade e diversas terapias integrativas. Além disso, projetos como “Meditação”, a “Liga da Saúde Mental” e o “Quilombo do Cuidar” são partes do Procriar, abordando temas de dança, arte, cultura, raça, gênero, identidade e sexualidade. Essas iniciativas proporcionam aos alunos a oportunidade de explorar essas temáticas de forma prática que vai além de estudar os conceitos na sala de aula. Paquiela destaca a importância de vincular a comunidade à Universidade através dos projetos de extensão. “A gente acredita que uma formação em saúde não é afastada do campo político, com isso pensamos em oportunizar para que a sociedade possa conhecer a Uerj a partir dos nossos projetos.” 

A relação entre a comunidade e o Procriar é um aspecto essencial do programa. Para que um projeto seja caracterizado como extensão, é necessário que haja uma conexão concreta entre a universidade e a comunidade. Isso é facilitado pela Rede 2.2, que organiza o território de saúde no Rio de Janeiro, permitindo a abertura de espaços tanto para os trabalhadores da saúde quanto para a comunidade local. A divisão territorial da cidade em áreas de planejamento e programáticas permite que os serviços de saúde atendam melhor às necessidades locais, seguindo a lógica organizacional do SUS.

Com a nova gestão da Faculdade de Enfermagem, foi criado um colegiado representando todos os departamentos: Fundamentos de Enfermagem, Enfermagem de Saúde Pública, Enfermagem Médico-Cirúrgica e Enfermagem Materno-Infantil. Esse colegiado inclui dois professores de cada departamento, um ligado às práticas integrativas e outro às oficinas de criação. Com essa estrutura, a Faculdade pretende organizar um cronograma anual para melhorar a gestão e a eficácia dos projetos de extensão. 

O Procriar não apenas beneficia a comunidade com suas práticas integrativas e oficinas de criação, mas também oferece aos alunos uma formação completa, integrando conhecimentos teóricos e práticos. Ele reside no endereço Boulevard 28 de Setembro, 157 – Vila Isabel, Rio de Janeiro – RJ, CEP 20551030

Após completar 96 anos, Verde e Rosa está cada vez mais próxima da população do Morro da Mangueira

Após completar 96 anos, Verde e Rosa está cada vez mais próxima da população do Morro da Mangueira

Carnavalesco da Escola conta a importância da Mangueira para a comunidade

Por: Everton Victor e Manoela Oliveira 

 
 
Quadra da Estação Primeira de Mangueira / Reprodução: Agência Brasil

A Estação Primeira de Mangueira comemorou seu aniversário de 96 anos, no último dia 28 de abril. A Escola celebrou com Rodas de Samba Cultural no Palácio do Samba, com a participação de mangueirenses que marcaram a história da “Verde e Rosa”, como Guesinha, neta do primeiro presidente da Mangueira, e Alvinho, integrante da Velha Guarda da Bateria. Além de comemorar quase um centenário, o objetivo da Escola é estimular “a reunião de seus compositores e convidados para cantar e relembrar os grandes sambas dos mestres do passado”, segundo a agremiação.

O legado quase centenário da Mangueira se estende para além da quadra da Escola, que fica no pé do morro da Mangueira. O Museu do Samba, localizado na Rua Visconde de Niterói, mesma rua da quadra da “Verde e Rosa”, é um retrato da memória do samba. Apesar de não ter vínculo administrativo com a Estação Primeira, reforça seu legado, o espaço conta com três exposições: Heróis da Liberdade, A Força feminina no Samba e Zi Cartola, essa última é dedicada ao legado de Cartola e Dona Zica, que contribuíram para a fundação da Escola em 1928. Para Sidnei França, carnavalesco da Mangueira, como um patrimônio da cidade, o Museu do Samba contribui com seus saberes e seus valores para a comunidade.

Museu do Samba / Reprodução: Everton Victor

De acordo com Amanda Cristina, mediadora do Museu, cada exposição explora um tipo de samba: partido alto, terreiro e enredo. “Nós somos o Museu do Samba, nosso objetivo é salvaguardar esse patrimônio em suas mais variadas vertentes, esses espaços não existem nem de, nem por, nem com, nem para o Carnaval, existe Carnaval sem Escola de Samba e existe Escola de Samba sem o Carnaval”, explica.

Segundo Sidnei França, os artistas e artesãos da agremiação possuem a responsabilidade de formar cidadãos conscientes para a comunidade. A Vila Olímpica da Mangueira foi citada por Sidnei como um dos espaços da Escola que contribui para a formação de talentos e para o desenvolvimento social dos jovens. O local oferece gratuitamente atividades esportivas para todas as idades, como ginástica rítmica, futebol e natação. A Vila conta com a inclusão de turmas para pessoas com deficiência (PCD) em diversas modalidades, esses alunos precisam apresentar o laudo médico antes de se matricular. 

Além de quadras, vila olímpica, viadutos e ruas, a história da “Verde e Rosa” e de seus baluartes também está presente em espaços de preservação da própria comunidade. A Mangueira do Amanhã, Escola Mirim do Pavilhão, Programa Social Mangueira, Mangueira do Futuro, Camp Mangueira e Instituto Profissionalizante Mangueira são alguns dos espaços onde a Estação Primeira expande sua atuação para a comunidade, oferecendo atividades educativas, profissionalizantes, esportivas e sociais. 

O simbolismo da agremiação para o morro também está presente na tradição de valorizar componentes que pertencem à comunidade, que se tornou uma marca d a Escola, como a rainha de Bateria Evelyn Bastos, que está há mais de 10 anos no posto. Evelyn também é presidenta da Mangueira do Amanhã e, mais recentemente, diretora cultural da Liga Independente das Escolas de Samba (Liesa). 

Sidnei França acrescenta que a Estação Primeira possui o objetivo de  desenvolver a cidadania na comunidade, promovendo a cultura e a consciência de pertencimento. “As pessoas da Mangueira precisam saber quem elas são, como elas interagem com o mundo pela produção do samba e da arte”, reforça. Ele afirma que o Morro da Mangueira está em um momento de retomar o protagonismo de seu próprio caminho, surgindo uma geração que enfrenta as dificuldades e os preconceitos. A Escola está criando uma geração que acredita na igualdade, na diversidade e no respeito ao outro, segundo o carnavalesco.

Letra Jovem: projeto da Uerj defende o direito à educação de pessoas em situação de vulnerabilidade social

Letra Jovem: projeto da Uerj defende o direito à educação de pessoas em situação de vulnerabilidade social

Coordenadora do Letra Jovem explica como funciona o programa

  

Por: Manoela Oliveira

                                   Projeto Letra Jovem / Reprodução: Márcia Lisbôa

O Letra Jovem atua em duas localidades: no Tribunal de Justiça, localizado no Centro do Rio de Janeiro, e no Centro Integrado de Educação Pública (Ciep), em São Gonçalo. O programa atende três grupos no TJRJ, o primeiro é o “Justiça pelos Jovens”. De acordo com Lisbôa, o grupo ajuda pessoas de 16 a 24 anos que tiveram algum conflito com a lei quando eram menores de idade. “Os jovens podem já ter cumprido a medida ou estar cumprindo essa medida”, completa.

O segundo grupo é o “Começar de Novo”, que atende pessoas que passaram pelo sistema carcerário e estão buscando uma oportunidade de ressocialização na sociedade. Segundo Cauã Bandeira, bolsista do Letra Jovem, o grupo alvo costuma ser composto por pessoas mais velhas, com idades próximas de 40 anos. O terceiro é o “Inclusão Legal”, que oferece aulas para pessoas em situação de vulnerabilidade e risco social. “A gente trabalha com mulheres que sofreram algum tipo de violência ou pessoas da comunidade LGBTQIA+”, explica a coordenadora.

Para Cauã, a existência de diferentes grupos em uma mesma sala de aula possibilita a aparição de pontos de vista distintos, porque os alunos “têm opiniões que divergem bastante”. Nivea Santos, bolsista do Letra Jovem, afirma que: “os mais velhos compartilham experiência com os mais novos”.

O Ciep permite que crianças do primeiro ao quinto ano participem de oficinas de alfabetização duas vezes por semana. A colaboração entre a escola e o projeto Letra Jovem iniciou em 2016, contribuindo no letramento de jovens com a ajuda de uma equipe de professores e de bolsistas da Uerj.

Etapas do Letra Jovem

                                    Bolsistas do Letra Jovem / Reprodução: Márcia Lisbôa

Cauã contou sobre a metodologia de três etapas usada no Letra Jovem e a importância da participação dos alunos, pois o tema de cada aula é escolhido por meio de uma votação. A primeira etapa é o “Mergulho no tema”, quando essa eleição ocorre e o gênero literário é selecionado. O tema deste ano é preconceito e a contribuição dos alunos é essencial, porque “existe gente de diferentes competências linguísticas”, de acordo com Lisbôa. Nesse primeiro momento, são usados vídeos, imagens, textos curtos e poemas para facilitar o aprendizado de todos.

A segunda etapa é o “Aprofundamento do gênero”, na qual ocorre o ensino de um gênero literário e da estruturação de um texto. Cauã compartilhou que, neste ano, os estudantes escolheram aprender redação. Por último, a “Emergência de ideias” é a etapa na qual os alunos escrevem o texto e recebem as correções e as sinalizações dos bolsistas. Segundo Cauã, o Letra Jovem pretende “fugir do modelo tradicional de aprendizagem”, promovendo o pensamento crítico e a reflexão entre os estudantes.

Importância do projeto

Para Lisbôa, o Letra Jovem é “um ativismo em defesa do direito à educação de pessoas em situação de vulnerabilidade extrema. Porque, os alunos aprendem a respeitar a opinião do outro e a expor seus argumentos”, afirma a coordenadora. De acordo com ela, a metodologia do projeto foi pensada com base nas ideias de Paulo Freire, mas foi somente participando do programa que ela aprendeu a ser uma “freireana de verdade”. Camila Ferreira, bolsista do Letra Jovem, disse que o projeto ajuda os estudantes a desenvolverem o senso crítico e, consequentemente, o conhecimento.

Uma pesquisa do Ministério da Justiça comprova que cerca de 80% dos presos voltam a cometer crimes quando são liberados. Porém, a taxa de não reincidência entre as pessoas que passaram pelo Letra Jovem é próxima de 100%, revela a coordenadora. Após terminarem as aulas, os alunos ainda são acompanhados pelo TJRJ.

Segundo Camila, sua maior dificuldade é aplicar o conteúdo para os alunos de maneira dinâmica durante o tempo curto das aulas. Cauã concorda que caso aumentasse o tempo das oficinas de redação e de português, seria possível proporcionar uma educação mais aprofundada aos alunos. Para Nivea, o TJRJ deveria ser flexível com as faltas dos estudantes, porque muitas pessoas moram em áreas distantes do Centro, onde fica localizado o Tribunal de Justiça. Apesar disso, de acordo com ela, os alunos querem participar das oficinas, pois “a educação é algo que ninguém pode tirar”

Quatro em cada cinco jovens brasileiros enxergam o futuro como assustador devido às condições climáticas

Quatro em cada cinco jovens brasileiros enxergam o futuro como assustador devido às condições climáticas

Vice-diretora do Instituto de Psicologia da Uerj explica os efeitos da ansiedade climática

Por: Manoela Oliveira

Foto: Adobe Stock

Um levantamento global da Universidade de Bath publicado na revista The Lancet Planetary Health revelou que 85% dos jovens brasileiros consideram o futuro assustador em razão das mudanças ambientais. O estudo teve a participação de 10 mil pessoas entre os 16 e os 25 anos, em 10 países (Austrália, Brasil, Finlândia, França, Índia, Nigéria, Filipinas, Portugal, Reino Unido e Estados Unidos).

De acordo com a pesquisa, as mudanças climáticas provocam consequências para o futuro e a saúde dos jovens e das crianças, sendo esse grupo vulnerável à ansiedade climática. Esse termo, segundo a Associação Brasileira de Letras (ABL), se refere ao “estado de inquietação e angústia desencadeado pela expectativa de graves consequências das mudanças climáticas e pela percepção de impotência diante dos danos irreversíveis ao meio ambiente”.

Para Laura Quadros, vice-diretora e professora do Instituto de Psicologia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), a ecoansiedade ou ansiedade climática impacta a sociedade como um todo. Ela explica que: “Temos que entender essa noção como algo coletivo, não como uma questão que acomete um indivíduo ou uma categoria de indivíduos”. Cerca de 50% dos brasileiros possuem sua rotina afetada devido às mudanças climáticas, de acordo com o The Lancet Planetary Health.

 

Foto: Reprodução própria, com o uso dos dados do The Lancet Planetary Health
 
 
 
 
 

O Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas das Nações Unidas comprovou que a atual crise climática é sem precedentes e as tragédias ambientais extremas podem se tornar cada vez mais frequentes. Segundo Laura, a desesperança é uma das consequências da ecoansiedade.“Quem tem hoje 15 ou 20 anos não vai ver certas melhoras no planeta”, conclui a professora. Porém, a ansiedade climática pode servir como um mecanismo de mobilização popular, especialmente entre os jovens. 

Laura destacou que a ecoansiedade estimula os jovens a desenvolverem um senso de compromisso maior com o planeta. “Não temos mais uma responsabilidade romântica, mas sim uma noção de sustentabilidade”, complementa. Um estudo da Escola de Comunicação, Artes e Design da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC – RS) revelou que cerca de 70% dos jovens brasileiros praticam alguma atitude sustentável.

Beatriz Evaristo, estudante de 19 anos de farmácia na Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), possui uma visão pessimista sobre o futuro por causa das tragédias climáticas. Para ela, sua maior preocupação é a incerteza do que acontecerá nos próximos anos. Essa é a tendência da maioria dos brasileiros, de acordo com o estudo da Universidade de Bath. Os brasileiros alegaram estar ansiosos (62,5%), tristes (69%), nervosos (64%) e com medo do futuro (72,5%). 

Maria Eduarda Galdino, jovem de 19 anos e aluna de jornalismo da Uerj, comenta que o governo não está fazendo ações eficazes para mitigar as crises climáticas.  Maria Eduarda está entre os cerca de 79% dos brasileiros que acreditam que as autoridades estão falhando em conter as mudanças ambientais, segundo The Lancet Planetary Health. O Brasil foi o país com o maior número de pessoas que relataram se sentirem traídas pelos governadores, com 77% dos entrevistados, em comparação com 58,5% da média global. 

A regulamentação da internet pode vir a ser uma forma de diminuir a ecoansiedade pela grande carga de informação nas redes sociais. De acordo com uma pesquisa da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), cerca de 72% das crianças avaliadas tiveram um aumento na depressão, na hiperatividade e na ansiedade devido ao uso excessivo de telas. 

Laura explica que é preciso “oferecer outras alternativas e criar outras oportunidades no campo das escolas e da família”. A professora citou a implementação da educação ambiental e financeira nas instituições educativas para promover a discussão da ecoansiedade, além de estimular práticas sustentáveis.

Copa do Mundo Feminina 2027 no Brasil: da ilegalidade até a sede do maior evento mundial de futebol feminino

Copa do Mundo Feminina 2027 no Brasil: da ilegalidade até a sede do maior evento mundial de futebol feminino

A 10ª edição do será sediada no Brasil, onde até a década de 80 era crime mulheres praticarem esporte profissionalmente. 

Por: Letícia Ribeiro

De crime à sede da Copa do Mundo de 2027, o caminho fora longo e sinuoso. As mulheres enfrentaram muitos obstáculos para estarem em campo. Subjugadas, proibidas, subestimadas e tendo seus sonhos tratados como puro amadorismo. A garra delas, porém, era mais forte. Nadando contra a opinião popular, as jogadoras não desistiram e, no final, levaram prêmios a uma nação que constantemente as desvalorizou.

Na sexta-feira (17), durante o Congresso da Fifa, realizado em Bangkok, na Tailândia, o Brasil foi o escolhido para sediar a Copa do Mundo Feminina de 2027. O país que, até a década de 80, tinha o futebol feminino, entre outras práticas esportivas, como ilegal. Agora, supera a candidatura conjunta de três países europeus – Alemanha, Bélgica e Holanda – com quarenta e um votos de diferença

Pela primeira vez, a escolha da sede da competição mundial foi realizada pelo Congresso da Fifa, contando com voto de 211 associações nacionais de futebol – 207 votos, já que os países candidatos não têm o direito de votar. 

A delegação brasileira com Marta, seis vezes eleita a melhor do mundo pela Fifa, como garota-propaganda. O Brasil  ganhou por 119 votos a 78 e, por ser anfitrião do Mundial, já está automaticamente classificado. Uma noite realmente memorável e vitoriosa não só para a equipe feminina do país, mas para todas as jogadoras brasileiras que carregam um histórico de luta pelo direito de estar em campo.

FUTEBOL FEMININO NO BRASIL 

Os primeiros registros de partidas de futebol feminino surgiram em 1920, ainda em um estágio bem inicial, no Rio de Janeiro, São Paulo e Rio Grande do Norte. Inicialmente, a prática esportiva feminina era considerada uma performance. Até a década de 40, o futebol entre mulheres era tido como uma prática comum das periferias – sem registros de uma seleção, ou um protótipo disso. Na época, a prática para elas ainda não era proibida, mas considerada violenta e ideal para homens.

Em 1940, no entanto, foi decretada a proibição, sob a alegação de que “não combinava com a formação física do belo sexo”. A visibilidade que as jogadoras estavam ganhando não acarretou coisas positivas, pelo contrário, elas foram alvo de revolta por parte da sociedade e viraram notícia, levando a opinião pública e, principalmente, as autoridades da época, a condenarem tal atividade. 

O veto aconteceu em 1941, durante o período ditatorial do Estado Novo (1937-1945), por um decreto assinado pelo presidente Getúlio Vargas:  “Decreto-lei, n. 3199, art. 54: Às mulheres não se permitirá a prática de desportos incompatíveis com as condições de sua natureza, devendo, para este efeito, o Conselho Nacional de Desportos baixar as necessárias instruções às entidades desportivas do país”.

Daí em diante, vários jogos femininos começaram a ser cancelados a mando do Conselho Nacional de Desportos (CND), vinculado ao Ministério da Educação. Algumas partidas até mesmo foram encerradas à força pela polícia. 

Se em 1941 o decreto-lei instituído trazia o texto de uma forma mais geral, não citando o futebol em si, no ano de 1965, na ditadura militar, a lei foi publicada novamente, mas de forma detalhada, especificando a modalidade. Além do futebol, outros esportes foram proibidos, como futsal, futebol de praia, polo aquático, rúgbi, beisebol, halterofilismo e qualquer tipo de luta. Essa proibição valia para disputas em estádios, abertas ao público e organizadas de forma profissional por clubes. Os jogos de rua, apesar de malquistos, não foram vetados.

As mulheres só voltaram a entrar em campo no fim dos anos 70, com a revogação da lei. E, em 1983, o CND regulamentou o futebol feminino, permitindo competições, criação de calendários, utilização dos estádios e o ensinamento nas escolas.

Poucos anos mais tarde, em 1988, a Fifa promoveu uma espécie de mundial experimental, que aconteceu na China. Denominado, em inglês, como Women’s Invitational Tournament, contou com a presença de uma seleção montada exclusivamente para o torneio, que tinha jogadoras das bases do Radar (RJ) e do Juventus (SP). Nessa ocasião, as meninas viajaram para os jogos com as sobras de roupas do time masculino. A competição foi um ponto de partida para o desenvolvimento do cenário feminino ocupando o esporte. Doze seleções participaram e o Brasil, por sua vez, levou o bronze nos pênaltis.

A PRIMEIRA COPA FIFA DE FUTEBOL FEMININO (1991)

Sediada na China, a primeira Copa do Mundo feminina teve, pela primeira vez, a CBF assumindo o time brasileiro, ainda que o tratasse como amador. Várias atletas que disputaram o torneio experimental jogaram pelo Brasil. A equipe, que contava com Delma Gonçalves, conhecida como Pretinha, e comandada pelo técnico Fernando Pires, teve menos de um ano de preparação. Apesar de eliminado na primeira fase, o país teve uma vitória contra o Japão, com o gol feito pela zagueira Elane – que marcou o primeiro gol do Brasil em torneios da Fifa.

PRIMEIRA OLIMPÍADA (1996)

A equipe feminina de futebol teve sua estreia nos jogos de Atlanta, Estados Unidos. Com a participação das veteranas do esporte, o Brasil alcançou a quarta colocação. Infelizmente, o país perdeu o bronze para a Noruega por 2 a 0.

PRIMEIRA MEDALHA FIFA (1999)

Mesmo sendo tratada, ainda, como esporte amador, a seleção feminina de futebol se superou na Copa do Mundo Feminina de 1999, sediada nos Estados Unidos. Levou o 3º lugar na competição, com resultados como 7 a 1 no México, 2 a 0 na Itália e um empate na Alemanha. Nas quartas, a jogadora Sissi fez o gol da vitória contra a Nigéria – que até os dias atuais é lembrado como um dos mais bonitos da história dos mundiais.

FENÔMENO DO FUTEBOL FEMININO: A CAMISA 10, RAINHA MARTA

Em 2003, a Copa do Mundo Feminina, sediada nos Estados Unidos, contava com a participação de um dos maiores talentos da seleção feminina de todos os tempos. Ainda jovem, Marta já conquistara a atenção das jogadoras mais experientes. Além da futura promessa do futebol feminino, naquele ano, também era o primeiro mundial da atacante Cristiane. O Brasil foi eliminado nas quartas de final para a Suécia. No mesmo ano, contudo, o país foi medalhista de ouro no Pan de Santo Domingo. 

No ano seguinte, com Marta, Pretinha, Formiga e Cristiane no elenco, o Brasil é medalhista de prata na Olimpíada da Grécia – o que viria a ser apenas o início do futuro promissor e vitorioso das meninas. 

E foi no ano de 2006 que a previsão se concretizou, dando orgulho à nação brasileira, Marta levou seu primeiro título como melhor do mundo. Sim, o primeiro, porque em 2007 veio o seu segundo e, quando se deu conta, em 2010, estava ao lado de Messi, empunhando seu quinto troféu de melhor do mundo. E, não obstante, em 2018, após uma temporada satisfatória no Orlando Pride, a camisa 10 recebe pela sexta vez o título de melhor do mundo. 

OS AVANÇOS DO FUTEBOL NO BRASIL – AINDA É PRECISO MUDANÇA

Atualmente, a seleção brasileira feminina tem ganhado maior destaque, referências como Pretinha, Marta e Formiga, entre tantas outras também, possibilitaram uma maior abertura para que as mulheres ocupem espaços que, há pouco tempo, lhes eram negados. Claro, ainda existem vários problemas, como a falta de investimento no futebol feminino, bem como a disparidade salarial entre homens e mulheres no universo futebolístico. 

É preciso persistência, perseverança e muita luta para alcançar toda uma gama de direitos que ainda são muito escassos no esporte feminino. E, com cada vez mais meninas realizando o sonho de se tornarem jogadoras, a luta vai se fortificando.

A PROMESSA DO FUTEBOL FEMININO

Conforme as portas vão se abrindo, mais meninas concretizam o sonho de se tornarem jogadoras. Como a promessa do futebol feminino brasileiro Giovanna Waksman. Com apenas 15 anos, a menina é tida como a maior revelação dos últimos tempos. 

Começou a carreira no Botafogo, no sub-13, em 2021, jogando com meninos – visto que o clube não tinha categoria feminina da idade dela. Em 2022, John Textor, dono do Botafogo, envia Waksman e sua família aos Estados Unidos, onde, atualmente, a menina estuda e joga por outro clube, também do empresário norte-americano. Em um desses jogos, a jovem craque marcou 8 gols – mostrando que as expectativas em torno dela vão se justificando. 

Não só Giovanna, como várias outras garotas, estão na busca dos seus sonhos no gramado. A Copa Mundial Feminina de 2027 é um marco na história de todas as jogadoras brasileiras, símbolo de uma luta que perdura desde a década de 20. 

 

O batizado de Tietasaura

O batizado de Tietasaura

Como cientistas da Uerj misturaram literatura e paleontologia para nomear novo dinossauro

Modelo de Tietasauro derbyana, criado a partir dos fósseis. Créditos: Kamila Bandeira

Cientistas da Uerj identificaram uma nova espécie de dinossauro que viveu na região do atual recôncavo baiano, cuja descoberta é especialmente relevante no campo da paleontologia. A espécie foi denominada Tietasauro derbyana. O achado foi anunciado no periódico Historical Biology.

O nome do dinossauro faz referência a Tieta, protagonista do romance “Tieta do Agreste”, de Jorge Amado, ambientado na região na mesma região onde foi identificado o dinossauro. O nome do animal também alude ao geólogo Orville A. Derby, um dos pioneiros da paleontologia brasileira. Com isso, o nome do novo dinossauro homenageia ao mesmo tempo a literatura e a ciência brasileiras.                          

Kamila Bandeira e Valéria Gallo, do Instituto de Biologia Roberto Alcantara Gomes (Ibrag), coordenaram a equipe responsável por essa descoberta. Os fósseis foram identificados por Kamila ao final do seu mestrado, no Museu de História Natural de Londres em 2016. Em 2020, após uma análise minuciosa dos registros, percebeu-se que eles podiam se tratar de exemplares perdidos, coletados entre 1859 e 1906. Por meio de uma análise comparativa com fósseis semelhantes, os pesquisadores constataram que eles continham particularidades biológicas, o que indica a descoberta de uma nova espécie. 

O achado também comprova a existência de dinossauros do tipo Ornithischia – uma ordem de herbívoros – nas Américas. Antes disso, somente evidências indiretas, como pegadas, indicavam a existências desse grupo nessa região. Com o achado dos fósseis confirma-se que eles efetivamente habitavam o continente. 

Segunda as pesquisadoras, os registros também são especialmente raros, pois datam de cerca de 130 milhões de anos atrás, época de uma era geológica conhecida como Pré-Barremiano. O achado de novas espécies desse período é bastante incomum. A pesquisa recebeu financiamento de instituições como a Capes, CNPQ e Faperj.

Escritório modelo de advocacia da Uerj oferece atendimento jurídico gratuito para a população do Rio de Janeiro

Escritório modelo de advocacia da Uerj oferece atendimento jurídico gratuito para a população do Rio de Janeiro

Cerca de  540 pessoas foram atendidas pelo escritório em 2023

Por: Maria Eduarda Galdino

Produção: Maria Eduarda Galdino



O escritório modelo de advocacia da Uerj, também conhecido como núcleo de práticas jurídicas, possui um legado de quarenta anos promovendo práticas de desenvolvimento educacional e atendimento ao público. O escritório foi aprovado pelo Conselho Departamental em 1978 para o desenvolvimento das práticas jurídicas dos alunos de advocacia da Uerj e segue até os dias de hoje.

Além do escritório ser um ambiente de prática jurídica dos alunos e advogados em residência, também fornece atendimento de forma gratuita, tanto para os estudantes e funcionários da Uerj quanto para os cidadãos cariocas que se encontram em algum tipo de vulnerabilidade financeira.

Como funciona

O contato com o escritório precisa ser agendado e pode ser feito de três formas: presencial, por telefone e online via e-mail. Após essa etapa, é feito um recorte geográfico para designar o público a ser atendido.

Somente pessoas que possuem tramitação no fórum da capital do Rio de Janeiro podem ser atendidas, esta condição é estabelecida pela própria legislação estadual para que as demandas possam ser cumpridas com qualidade. Quando é solicitado o atendimento, a pessoa passa por uma triagem e abre-se uma ficha de atendimento e o cliente já é encaminhado para algum residente jurídico.

O escritório atende nas áreas Cível, família, inventários, alimentos, divórcios, direitos do consumidor e trabalhista, e também Penal. Matérias como INSS, direito internacional e previdenciário não são atendidas por conta da falta de especialistas nessas áreas.

A coordenadora do escritório, Márcia Michele Garcia, destaca a importância do suporte gratuito à comunidade para o funcionamento da democracia e cidadania. Para ela, quanto mais esse contato é realista e acessível, as relações entre a Universidade e a comunidade externa se fortalecem. Além disso, ela diz que o acesso à educação e formação de qualidade na Uerj se desenvolve a partir de projetos como esse, que utilizam a prática e a realidade para o mercado de trabalho. Sendo assim, alunos de graduação e pós-graduação precisam passar pelo escritório como parte da grade obrigatória do curso de direito.

“São situações que elevam o contato do estudante graduando ou pós-graduando e permitem que esse estudante tenha contato com o dado de realidade que às vezes eles não tem ou não tenham tido pela sua própria experiência de vida, então são situações às vezes muito extremas, que a gente conhece aqui de dor humana, dor economica, dor emocional, dor espiritual, dor de abandono e são muitas experiências que nós podemos vivenciar por aqui, isso facilita que a gente se torne mais e mais humano sem que necessariamente a gente tenha vivido aquela dor”. Relata a coordenadora.

Márcia afirma que os alunos da pós -graduação passam por uma seleção por meio de prova escrita feita pela Uerj, e o escritório recebe os estudantes aprovados, alocando cada estagiário em plantões definidos. Já os graduandos têm a obrigação de passarem pelo escritório, porque de acordo com o projeto pedagógico do curso de direito associado ao estatuto da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) é primordial que o aluno de direito passe pelo estágio obrigatório depois de cumprir três quintos do curso, isto é, dois anos.

Nesses dois anos o aluno passa por uma prova oral com uma banca avaliadora que determina a aptidão ou inaptidão do estagiário. Caso o estudante seja apto, a coordenadora assina o certificado que é enviado e chancelado pela OAB. Ela ressalta que essa prova não é determinante para a conclusão do curso e sim uma avaliação de desempenho, e que o aluno pode recorrer a outro exame caso seja reprovado. 

Desenvolvimento e suporte

O escritório passou por várias mudanças estruturais ao longo dos anos, principalmente a partir de março de 2023. Neste ano, as bolsas voltaram a ser disponibilizadas para os  residentes que retornaram para o NPJ (Núcleo de Prática Jurídicas) sob a coordenação do professor e advogado Daniel Queiroz, depois de 8 anos sem residentes devido à crise financeira no Estado do Rio de Janeiro em 2016. 

A partir da reabertura dos atendimentos, 540 pessoas já foram atendidas e a infraestrutura do escritório começou a se modernizar com a criação de um auditório, sala de mediação e recursos tecnológicos para a digitalização do acervo do escritório que antes era cem por cento físico e ocupava o que hoje é o auditório. Parte dos materiais foram comprados através da própria verba da direção da Faculdade de Direito e outros recursos foram custeados pela Uerj.

Em 2022, o escritório desenvolveu recursos tecnológicos como o PID (Ponto de Inclusão Digital) apoiado pelo Conselho Nacional de Pesquisa, que é um convênio que fornece aparatos tecnológicos para a realização de chamadas de vídeo para audiência, mediações e visualização no andamento de processos via internet, mesmo que a pessoa não esteja sendo acompanhada pelo escritório. O objetivo desse convênio é promover a inclusão digital das pessoas em vulnerabilidade social.

Outro ajuste estabelecido em 2022 foi o PASCE (Polo Avançado de Solução de Conflitos Extrajudiciais), um convênio que a Uerj firmou com o Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. E através desse convênio, foi inaugurado um espaço de solução consensual, também chamado de sala de reunião de mediação, onde acontecem mediações judiciais antes da abertura de uma ação judicial. Os conflitos apresentados aos advogados do escritório passam por uma tentativa de solução para o desacordo.

13 de maio: data simbólica, mas será pelo motivo certo?

13 de maio: data simbólica, mas será pelo motivo certo?

Há 143 anos nascia em Laranjeiras, Zona Sul do Rio, o escritor e jornalista Lima Barreto

Por Everton Victor

Lima Barreto. / Reprodução: UFMG
 
 
 
 

A abolição dos negros, em 1888,  é “celebrada” neste dia, apesar de críticas do movimento negro em comemorar a data. Curiosamente, neste mesmo dia, alguns anos antes, em 1881, nasceu no Rio de Janeiro um escritor negro que se tornou um símbolo da literatura brasileira. Encantou o Brasil com o dom da palavra, ao trazer para suas obras a sensibilidade, seu olhar aguçado do dia a dia, desabafos, sem perder o lado crítico, se tornando uma representatividade antes mesmo desta palavra ficar em alta. O nome dele é Afonso Henriques de Lima Barreto.

Já na infância, aos 6 anos, Lima Barreto teve que lidar com a morte de sua mãe, a professora Amália Augusta, vivendo com seus irmãos e seu pai, o tipógrafo João Henriques. Carmen Lúcia,  professora da Uerj e escritora do livro “Lima Barreto em quatro tempos”, explicou como ele era um incansável estudioso e apesar das dificuldades nunca parou, frequentando espaços destinados à elite carioca. “Ele estudou no Liceu Popular Niteroiense e depois foi para a Escola Politécnica, com problema de saúde do pai, precisa assumir a família, e se tornar funcionário público, ficando difícil seguir na Politécnica”, acrescenta Carmen.

Na construção de seus textos, Lima também escreveu o que chamava de “retalhos”, diversos cadernos com suas anotações, leituras feitas e, curiosamente, recortes de jornais.  A professora ressalta que Lima Barreto não estava à parte das questões políticas da época. “Ele batia em seus textos em questões que muitos intelectuais defendiam (…) Nacionalistas, que culpabilizam indivíduos pobres,  que diziam que o Brasil não é uma nação civilizada”. Ao mesmo tempo, a linguagem nas obras dele estava próxima das ruas, de forma “lúdica” que ele aprendeu nos jornais. Já em maio de 1918 reúne suas crônicas no volume Mágoas e sonhos de um povo, criticando as reformas urbanas.

  • Influências

O escritor, durante a juventude, era um assíduo estudioso, estando inserido em debates sobre o contexto nacional e internacional. Escritores russos, como Tolstoi e Dostoievsky estavam presentes nas leituras de Lima Barreto. “Foi um dos primeiros a divulgar a literatura russa no Brasil”, afirmou a professora. Na revista A.B.C, Lima lançou o Manifesto Maximalista, que defendia uma sociedade diferente da que emergia no Brasil, abordando concentração de renda e terras, legalização do divórcio, e a revolução russa.

A professora aponta uma curiosidade de Lima:  mesmo ele sem ir para a Europa, ele indicava para os amigos o que visitar por lá. “Ele que estava aqui sabia mais do que as pessoas que iam para lá, ele aproveitava para pedir livros”.  Aliado à literatura, o contexto dos negros internacionalmente também era foco de leituras do escritor. “Ele estava a par do que acontecia fora do país, uma vez com os amigos na França ele pediu o livro “Le Préjugé Des Races” (O preconceito racial), do escritor Jean Finot, o único intelectual francês da época contra a teoria das raças”, explica. 

  • Jornalista Lima Barreto

Ainda na juventude ganhou reconhecimento cedo entre seus pares, contribuindo em jornais. “Desde a Escola Politécnica ele já colaborava em jornais, como A Tagarela”, afirma Carmen.  No Jornal do Commercio publicou em folhetins uma de suas mais notórias obras, o romance “Triste fim de Policarpo Quaresma”(1916), sendo considerado um pré-modernista.  Também teve passagem na revista Floreal, em 1907, nos periódicos Correio da Manhã, revista Careta, Gazeta da Tarde, revista Fon-Fon, entre outros. 

Uma de suas mais notórias produções jornalísticas é uma série de reportagens em 1905 sobre o Subterrâneo do Morro do Castelo para o jornal Correio da Manhã. Sendo uma mistura da ficção de tesouro enterrado no morro, ao mesmo tempo que traz uma denúncia sobre os malefícios da reforma urbana. Essa série de reportagens se tornou um livro, disponível até hoje. Em suas obras é notória a sátira e as ironias e caricaturas que estavam presentes nas obras de diversos escritores do início do século XX.

  • Linguagem Popular

Parte da Crítica atribui ao escritor Lima Barreto uma baixa qualidade linguística, por sua linguagem de fácil entendimento, o que para a professora Carmen não se sustenta, pois ele incorpora nesta fácil linguagem ideias de outros escritores e filósofos. “Ele tem um método que contradiz aquilo que a gente lê na Crítica e no senso comum, a gente lê que o Lima produzia de bar em bar, como se aquela produção viesse por acaso, mas não é bem assim, é muita pesquisa e muito estudo”.

A fase conturbada de Lima, o alcoolismo, era um problema presente, mas ele tinha consciência disso. “É interessante a gente ressaltar que a todo tempo existe uma auto consciência desse problema. Nos diários, ele fazia comentários que tinha que parar”, afirma a professora. Para ela, é um erro “justificar a obra por esse vício”.

Lima Barreto tentou duas vezes ingressar na principal instituição literária do país, a Academia Brasileira de Letras, e nas duas vezes foi negado – na primeira tentativa, seu pedido foi desconsiderado ainda na inscrição. De acordo com Carmen Lúcia, “não há um fator único que justifique isso. Há um viés político de poder que justifica a entrada de uns e não de outros. O Lima cronista e que usa a tribuna da imprensa não é um Lima que agradava todo mundo”. A Academia deu menção honrosa perto do fim da vida do autor, em 1920, pelo livro Vida e morte de M. J. Gonzaga de Sá.

  • Racismo

A questão racial está presente não só nas obras, mas nas suas fases e vivências na cidade e no ambiente intelectual. Carmen classifica em três pontos o racismo e seu impacto na vida de Lima Barreto. “Quando ele usa a tribuna da imprensa denunciando o racismo na cultura brasileira usando todos os argumentos dos escritores que ele lia na época para falar das absurdidades que aconteciam em termos de negligência, violência e opressão, ele comentava com muita segurança sobre o massacre dos negros nos Estados Unidos depois da guerra civil e dizia: olha isso está acontecendo no Brasil”.  

A construção dos textos como escritor, para Carmen, é influenciada pela questão racial. Ela cita o romance “Clara dos Anjos” (1948), publicado após sua morte,  que traz críticas sociais e explora a construção da consciência racial da personagem. Enquanto no periódico Diário Íntimo, mostra como a questão racial o formou. “Quando Conceição Evaristo fala em escrevivência ela amplia esse processo de que sou eu e toda uma descendência que carrego comigo, isso me define, então ela fala da história de muitos, mas parte da primeira pessoa, parte da sua experiência, então é esse movimento que Lima capta desses pensadores do início do século e ele aprofunda em sua literatura”.

Legado

Jornal homenageando a vida de Lima Barreto. / Reprodução: Brasil na Foto/Gov
 
 
 

Lima Barreto morreu precocemente, aos 41 anos, de ataque cardíaco por complicações do alcoolismo. Além do alcoolismo, lidou com a depressão e com sua breve passagem pelo hospício, que é abordada em sua obra Diário do Hospício, publicada em 1953.  O escritor acumula um acervo de obras variadas, de contos, romances, diários, crônicas, artigos e reportagens.

Lima Barreto é doutor honoris causa pela UFRJ, onde estudou na Escola Politécnica, título que só veio 101  anos depois de sua morte. Ele também já foi homenageado na Marquês de Sapucaí, no Rio de Janeiro, em 1982, pela Unidos da Tijuca. Além de contar com outros títulos, filmes, nome de ruas e biografias em sua homenagem.  

Para o escritor Anderson Shon, a literatura negra perpassa as obras de Lima Barreto. Um dos livros de Anderson, o “Estados Unidos da África”, produzido em parceria com Daniel Cesart, traz o empoderamento negro em quadrinhos para o público adulto. Ele explica que ao longo de mais de 10 anos publicando livros, sendo mediador e palestrante da Bienal da Bahia, ainda é um desafio ser reconhecido pela Academia. “A gente não é visto pela Academia como saber, a menos que a gente esteja estudando alguém que está morto (…) A gente não precisa que uma geração morra para estudar ela”. No último sábado, o escritor lançou o romance “Não termine comigo, Joana”.

De acordo com a secretária dos Comitês de Cultura Roberta Martins, o Ministério da Cultura tem como princípio fomentar artistas negros, através de ações afirmativas nos seus principais projetos. “A gente tem a Lei Paulo Gustavo (R$3,8bi), a Lei Aldir Blanc (R$3bi), os artistas negros têm um percentual destinado obrigatoriamente para execução em municípios e estados para as suas produções, e isso é fundamental porque está incidindo efetivamente no financiamento”, afirma a secretária.

Roberta conta que a Cultura faz um resgate das personalidades negras através de editais, e  quando celebra a memória dessas personalidades. “A Fundação Palmares tem uma espécie de panteão de personalidades negras que foi retomado nesse ministério, estão lá Lima Barreto, Jurema Batista, Léa Garcia, Martinho da Vila”. Para  a secretária, esse resgate é uma ponte com a população negra de hoje, “é trazer os brasileiros para próximo de nós”, ressalta.

Olimpíada de Paris 2024 quebra recorde de participação feminina

Olimpíada de Paris 2024 quebra recorde de participação feminina

Pela primeira vez na história, as mulheres representam 50% do total de atletas nos Jogos Olímpicos  

Por: Everton Victor e Manoela Oliveira

Getty Images / (Foto: Sandro Di Carlo)
 
 
 

Após 128 anos da realização dos Jogos Olímpicos, as atletas do gênero feminino representam pela primeira vez 50% dos participantes nas Olimpíadas. Ao todo são 10.500 atletas – sendo metade homens, metade mulheres –  presentes nas competições durante 26 de julho a 11 de agosto de 2024 na capital francesa. A paridade de gênero alcançada é um marco no evento, que na sua primeira edição, em 1896, proibiu a participação de atletas mulheres.

Até o momento, o Brasil tem 216 vagas garantidas para as Olimpíadas de Paris. Desse número, cerca de 100 atletas para os jogos serão mulheres, de acordo com a lista de vagas e modalidades que o Comitê Olímpico Brasileiro (COB) detém. A quantidade ainda pode mudar por conta de disputas em algumas modalidades que valem vagas para as Olimpíadas.

O pioneirismo na paridade de gênero é um dos marcos desta edição que contará com a estreia de duas modalidades. A novidade é o Breakdance, a mistura da dança e da música; nessa disputa, dois atletas se enfrentam, enquanto o DJ toca uma música aleatória, e quem performar melhor em 60 segundos ganha. Outro esporte adicionado é o Caiaque Extremo, uma competição entre quatro barcos que percorrem um trajeto e quem chegar primeiro vence. Ao todo serão 48 modalidades presentes nesta edição.

Se por um lado a paridade está no âmbito dos atletas, essa realidade ainda não chegou para os cargos de liderança nos Comitês Olímpicos. No Brasil, segundo o COB, nos Jogos Olímpicos de Tóquio 2021, o quantitativo de mulheres na comissão técnica era de apenas 10% do total de membros, já entre as chefes de equipes na comitiva brasileira é de 20%.

Para Silvio Telles, professor do Instituto de Educação Física da Uerj e da Escola de Educação Física e Desportos da UFRJ, o desafio de inclusão das mulheres no esporte deve ser enfrentado por todos, inclusive pela mídia. Taciana Pinto, gerente de Desenvolvimento e Mulher no Esporte do COB explica que “diversos levantamentos mostram que o tempo de mídia para o esporte feminino é muito menor que o masculino, e que muitas vezes as atletas são retratadas pelos seus atributos físicos ou familiares e não pelo seu desempenho esportivo”. De acordo com ela, com a inclusão das atletas na mídia, jovens meninas são encorajadas a perseguirem seus sonhos no campo esportivo. 

Paris. Reprodução: Agência Brasil

Desigualdade de gênero no cenário esportivo

O início da era moderna das Olimpíadas foi em 1896, porém as mulheres começaram a participar dos jogos em 1900, representando apenas 2,2% do número de atletas. A expansão das modalidades foi lenta, mas, ao longo dos anos, as mulheres conquistaram o direito de competirem em esportes como o atletismo e o vôlei, que eram proibidos pelo Comitê Olímpico Internacional (COI).

Depois de 124 anos desde a primeira participação feminina nas Olimpíadas, ainda existem barreiras para a igualdade de gênero nos esportes. Silvio discutiu as dificuldades das mulheres no cenário esportivo, destacando o preconceito como um dos motivos agravantes. “Se constrói, dentro do campo esportivo, uma representação social de que a mulher não é adequada para aquele tipo de prática”, afirma o professor. O levantamento global realizado pela Nike e pela Dove revela que, só no Brasil, cerca de 89% das meninas acreditam que deveria haver mais inclusão feminina nos esportes. 

Fernanda Barbosa, formada em Educação Física pela Uerj, afirma que muitas mulheres desistem de suas carreiras no esporte devido à falta de incentivo financeiro. Ela reforça que: “Eu tenho que escolher entre estudar e trabalhar ou jogar bola, tive que escolher estudar e trabalhar”. De acordo com Fernanda, as atletas possuem dificuldade em conciliar as práticas esportivas com o trabalho ou o estudo. “O que falta no Brasil é o investimento”, conclui. 

Investimentos na inclusão das mulheres no esporte

O COB vem trabalhando para fornecer maior qualidade no desenvolvimento das jovens atletas, segundo Tatiana. “O mapeamento da estrutura oferecida para as seleções femininas, seja na quantidade de competições nacionais e internacionais, seja na composição da comissão técnica, e também pelo investimento direcionado às mulheres no esporte”, ressalta.

O COI, em parceria com a ONU Mulheres, desenvolveu o programa “Uma Vitória Leva à Outra” (UVLO). O projeto visa garantir espaços seguros para as meninas na área esportiva, proporcionando oficinas temáticas sobre autoestima, liderança, saúde e direitos sexuais e reprodutivos. De acordo com a ONU Mulheres, o programa é um legado da Olimpíada do Rio 2016 e alcançou 217.000 mulheres em 25 países.