Perspectiva LGBTQIAPN+ na saúde mental e na política: confira as discussões do terceiro dia do Berro!
Por: Hyndra Lopes
O último dia do evento (06/11) promoveu mesas sobre os desafios enfrentados pela população LGBTQIAPN+ nos âmbitos da saúde mental e da política. Além de encerrar as sessões da II Jornada Identidades, Gêneros, Corpos e Sexualidades.
Da esquerda para a direita: Bruna Benevides, Dani Balbi, Ricardo Ferreira Freitas e Benny Briolli na mesa “LGBTQIAPN+ na política”, no auditório 93 (9° andar da Uerj Maracanã). Foto de Luana Maciel.
O Berro!, evento promovido pelo Laboratório de Comunicação, Cidade e Consumo (Lacon) da Faculdade de Comunicação Social (FCS Uerj), encerrou na última quinta-feira e trouxe a saúde mental e a política como pautas para as palestras. As mesas promoveram discussões acerca das demandas LGBTQIAPN+ e da sua representatividade nestes campos, com a presença de figuras relevantes na cena, como Benny Briolli e Dani Balbi. A II Jornada Identidades, Gêneros, Corpos e Sexualidades também finalizou no mesmo dia, contando com trabalhos que trouxeram a visão LGBTQIAPN+ em diversos âmbitos da sociedade.
O terceiro dia de evento iniciou, pela manhã, com as últimas apresentações de trabalho da II Jornada Identidades, Gêneros, Corpos e Sexualidades. A sessão 7 foi coordenada por Débora Gauziski, pesquisadora e professora adjunta da FCS Uerj, e Julia Ourique, jornalista e doutoranda em Comunicação pela Uerj. Já a sessão 8 foi coordenada por Diego Cotta, doutor e mestre em Mídia e Cotidiano pela Universidade Federal Fluminense (IACS/UFF), e Fran Pimentel, jornalista e doutoranda do PPGCOM Uerj. Os trabalhos abordaram diversos temas acerca da diversidade e pluralidade, com foco na perspectiva LGBTQIAPN+ nos diferentes campos culturais e sociais.
Na parte da tarde, ocorreu a palestra “LGBTQIAPN+ e saúde mental”. A mesa contou com Marcelle Esteves, psicóloga clínica e ativista, Mario Carvalho, Psicólogo e Pesquisador do Instituto de Psicologia da Uerj, e Céu Cavalcanti, Professora adjunta da UFRJ e secretária de saúde mental da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA). Os palestrantes trouxeram como pauta principal a falta de amparo familiar e do Estado para pessoas LGBTQIAPN+ e os impactos negativos provocados na sua saúde mental.
Da esquerda para a direita: Céu Cavalcanti, Marcelle Esteves e Mario Carvalho, com projeção ao fundo: “Não se trata de uma fragilidade intrínseca, mas sim do resultado direto de um ambiente social hostil.”. Foto de Luana Maciel.
Homossexuais, pessoas trans e travestis são alvos constantes de diversos tipos de violência por conta do preconceito. De acordo com Marcelle, essa situação gera o chamado “estresse de minoria”, carga emocional acumulativa que afeta pessoas oprimidas socialmente e pode desencadear depressão e ansiedade. O quadro é mais latente entre pessoas LGBTQIAPN+, considerando que metade desta população no Brasil já apresentou esses transtornos. Mario complementa a questão posta pela psicóloga ao apontar que grupos socialmente minorizados tem maior índice de comportamentos suicidas, motivados pela violência sofrida, e jovens LGBTQIAPN+ estão mais suscetíveis a cometerem suicídio.
Os prejuízos à saúde mental desse grupo tem raízes sociais, devido à carência de uma rede de apoio por parte da família, dos amigos e do Estado para proverem, além da base emocional, auxílio psicológico, econômico e educacional, por exemplo. Céu Cavalcanti frisa essa ideia ao apontar que o tratamento psicológico não pode ser encarado como algo individual da pessoa e destaca a importância do termo “psicossocial”, que sai da lógica individualizada do adoecimento para entender que a questão engloba outros problemas sociais, como a fome, a pobreza e o preconceito. “Não queremos sobreviver, queremos viver bem”, declara Céu.
O último dia de Berro! finalizou com a palestra “LGBTQIAPN+ na política” e contou com presenças ilustres como Ricardo Ferreira Freitas, coordenador do Lacon, Bruna Benevides, presidenta da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA), Dani Balbi, deputada estadual do Rio de Janeiro e primeira mulher trans eleita pela Alerj, e Benny Briolly, vereadora de Niterói e primeira mulher trans eleita para cargo no município. As discussões envolveram a luta da comunidade LGBTQIAPN+ na política, para alcançar cargos de poder e reivindicar os seus direitos, com destaque para as cotas trans na universidade. Como apontou Ricardo, enfatizar essa questão na Uerj é necessário para incentivar a reitoria em prol da aprovação dessa medida.
Bruna Benevides falando durante a mesa “LGBTQIAPN+ na política”, ao lado de Dani Balbi, Ricardo Ferreira Freitas e Benny Briolli, no auditório 93 (9° andar da Uerj Maracanã). Foto de Luana Maciel.
Dani Balbi, em sua fala, afirma que ser transsexual, por si só, já é um ato político e defende a importância das cotas trans na universidade para além do impacto individual na trajetória dessas pessoas. A universidade é uma instituição de direcionamento de pesquisa e é responsável por promover novas visões de mundo. Logo, a implementação das cotas trans contribui também para produzir políticas públicas voltadas à comunidade, adensar o debate social acerca de questões LGBTQIAPN+ e modificar o curso da história, com a inserção de pessoas historicamente marginalizadas em locais de grande prestígio social.
A perseguição da população LGBTQIAPN+ retardou a sua participação política efetiva e a conquista dos seus direitos, como denuncia Bruna Benevides: “Essas perseguições, essas mobilizações, não são recentes, elas sempre tiveram esse papel de manter no poder o que é hegemônico”. Mesmo assim, a comunidade nunca deixou de lutar pela sua inclusão e de se mobilizar na disputa por um espaço na política institucional. Em 2020, foram eleitos mais de 30 vereadores e vereadoras trans, representando um grande avanço no cenário político brasileiro. Ela diz que estamos vivendo o sonho das travestis mais velhas, que visavam e gestaram esse poder político.
Finalizando a noite, Benny Briolli fala sobre a continuidade da luta política LGBTQIAPN+, e denuncia a predominância da heteronormatividade nas instituições brasileiras, que não foram pensadas e nem pensam na multiplicidade de corpos, sobretudo nos corpos trans. A naturalização desses indivíduos em espaços de amplo reconhecimento nacional deveria ser óbvia, mas, como não é o que acontece, torna-se ainda mais imprescindível. Além da inclusão, é importante que as questões e os direitos da população LGBTQIAPN+ sejam postas em pauta por seus membros integrantes. “Quando a gente traz esse debate, a gente traz o nosso corpo para o centro da discussão”, declara a vereadora.
Dessa forma se encerra o Berro!, evento que levantou diversas reflexões acerca das perspectivas da população LGBTQIAPN+ nos mais variados âmbitos sociais. A promoção desses encontros na universidade possibilitam a visibilidade e a construção de conhecimento acerca da luta dessa comunidade, constituindo um ato político. Como Bruna Benevides aponta em sua fala, uma política “transversal, interseccional e diversa”.








