Regiões mais pobres do Rio de Janeiro são mais afetadas pelo calor
Pesquisadora da Uerj explica por que a desigualdade tem a ver com a crise climática
Por: Maria Eduarda Galdino

Cidade de Nilópolis. Foto: Maria Eduarda Galdino
O Rio de Janeiro atingiu o terceiro nível do Protocolo de Calor (CALOR 3) na última Terça-feira (02/04) às 14h10. O calor de nível 3 é comunicado pela Prefeitura do Rio quando são registradas temperaturas de 36ºC a 40ºC, com previsão de permanência ou aumento de, ao menos, três dias consecutivos. Além das temperaturas elevadas, outra coisa chama atenção: o contraste de temperatura em diferentes regiões do Estado.
Às 14h10, o bairro de Botafogo, na Zona Sul do Rio, atingiu a temperatura de 29ºC, enquanto a cidade de Nilópolis, na Baixada Fluminense, atingiu 34ºC no mesmo horário. Mariana Castro, doutoranda em Ciência Política pelo IESP-UERJ e pesquisadora no Observatório Interdisciplinar das Mudanças Climáticas (IMC), explica que a diferença significativa nos termômetros tem explicação histórica. “Durante décadas a gente vê que as populações mais pobres e racializadas foram empurradas para as áreas com menos infraestrutura, menos serviços, menos proteção ambiental, e tudo isso resulta no que estamos vivenciando agora, o impacto das ondas de calor estão muito mais severas para quem vive em situação de vulnerabilidade.”
Além do histórico de reclusão da população mais vulnerável, a pesquisadora aponta outras questões que aumentam os efeitos do calor extremo em regiões mais pobres, como a falta de orçamento nas cidades para investir em soluções ecológicas, o crescimento urbano desordenado e a falta de gestões governamentais comprometidas com a permanência de projetos voltados para o ambiente urbano. “Essas medidas acabam ficando em segundo plano, outro problema é a questão da desigualdade social territorial, as áreas mais pobres são as que mais sofrem com calor e muitas vezes elas não são priorizadas na hora de construir e colocar em prática as políticas públicas. Enquanto isso, os bairros mais ricos têm mais infraestrutura e acabam recebendo mais investimento “, disse.
Segundo a Plataforma AdaptaBrasil, do Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), os municípios da Baixada Fluminense possuem níveis altos de exposição às mudanças climáticas, como desastres geo-hidrológicos, inundações (Índice 0,89 de 1,00) e demanda de resfriamento devido às ondas de calor intensas (Índice 1,00 de 1,00). A pesquisadora Mariana Castro afirma que os grupos que residem em áreas mais pobres sem adaptação às temperaturas elevadas estão mais expostos ao risco de morte por conta do fenômeno das ilhas de calor. “A forma como o próprio bairro foi estruturado é diferente, as comunidades são muito mais próximas umas das outras, com material de baixa qualidade que intensifica o calor, isso impede a circulação do ar e aumenta o fenômeno das ilhas de calor por exemplo
Demanda de resfriamento na cidade de Nilópolis. Foto: AdaptaBrasil /Eduarda Galdino
Em fevereiro deste ano, durante o Encontro de Novos Prefeitos e Prefeitas, o governo brasileiro apresentou uma estratégia inédita chamada Adapta Cidades, iniciativa do Programa Cidades Verdes Resilientes e coordenada pelo Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA). O objetivo é orientar e auxiliar cidades com capacitações técnicas de planejamento ambiental e acesso a investimento. Representantes de onze estados – Alagoas, Amazonas, Bahia, Ceará, Piauí, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Tocantins e Pará – estiveram presentes e sinalizaram interesse em participar da iniciativa.
A iniciativa é parte dos compromissos ecológicos do Brasil formalizados na 29 ºConferência do clima da Organização das Nações Unidas (ONU), a COP 29, em 2024 pelo vice-presidente Geraldo Alckmin e a Ministra do Meio Ambiente Marina Silva, em cooperação com a Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC), pacto do Brasil assinado no Acordo de Paris para combater a instabilidade ambiental em 2015.
A pesquisadora Mariana Castro reitera que diversas práticas ecológicas podem ser implementadas nas políticas públicas para mitigar os efeitos das ondas de calor, como investimentos em materiais de construção que são mais resistentes às temperaturas elevadas e plantações de áreas verdes nos centros urbanos. “É importante a gente mexer nas infraestruturas da cidade por exemplo criar a calçadas permeáveis, investir em telhados verdes, plantar mais árvores nos bairros mais quentes,trocar telhas por materiais que isolam melhor o calor e pintar os telhados com tintas que refletem o sol e garantir ponto de água potável em locais públicos.”