Entre o protagonismo global e o complexo de vira-lata

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Entre o protagonismo global e o complexo de vira-lata

Pesquisa  mostra opinião de brasileiros sobre o Brasil e aponta desafios para não reforçar estereótipos

Por: Sofia Inerelli

Manaus (AM), 29/11/2024 – Reserva florestal Adolpho Ducke, do Instituto Nacional de Pesquisa da Amazônia (INPA), onde se localiza o Museu da Amazônia (MUSA). Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil

 

De um lado, um Brasil em que se destacam a hospitalidade, o turismo e a natureza; de outro, um país onde há racismo, desigualdade, violência e exploração ilegal de sua biodiversidade. É essa a imagem do Brasil que aparece numa pesquisa realizada pela Comissão Temática de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, órgão integrante do Conselho de Desenvolvimento Econômico Social Sustentável (CDESS) da Presidência da República do Brasil. Os resultados foram apresentados no Rio Innovation Week (RIW), em agosto de 2025, no Rio de Janeiro.

A pesquisa foi encomendada em 2023, como parte do investimento em imagem e reputação do Brasil no ano em que vai sediar a COP30, a Conferência do Clima das Nações Unidas. Foram ouvidas 3.357 pessoas em todo o país. Entre os entrevistados estavam os integrantes do CDESS, especialistas em Brasil, lideranças de vários setores e cidadãos comuns. Algumas figuras de destaque presentes na pesquisa foram o cantor e compositor Gilberto Gil, a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, e o escritor Ailton Krenak, primeiro indígena a integrar a Academia Brasileira de Letras.

Os autores do trabalho são Jeanine Pires, Lourenço Bustani, Marcel Fukayama, Victor Cremasco, Fabio Issao, Debora Emm e Túlio Custódio. O grupo apresentou os resultados e destacou que buscou escutar diferentes públicos estratégicos para garantir uma abordagem ampla e representativa do Brasil. Segundo os autores do trabalho, a ideia da pesquisa era “levantar um espelho” com o intuito de provocar reflexões nas lideranças e na população brasileira, em relação a como se enxergam e aos caminhos possíveis e promissores para recompor sua identidade.

 

Ao ser questionado sobre a possibilidade de o estudo se tornar uma propaganda do Brasil, Túlio Custódio, colaborador da pesquisa, afirmou que essa era uma preocupação real de seus idealizadores. Mas diz que o trabalho não é um marketing para higienizar a imagem do Brasil e sim propor caminhos para que o país construa uma imagem alinhada aos desafios internos e também globais. E para que a sociedade brasileira e entidades internacionais possam compreender melhor a identidade da nação e o que pode vir a se tornar. 

O trabalho chama atenção para percepções muitas vezes limitadas sobre o Brasil. Destaca, por exemplo, que enxergar o país como um lugar voltado à diversão acaba fazendo com que seja associado à falta de seriedade — e, consequentemente, à incapacidade de discutir e resolver questões mais complexas. A pesquisa também mostra que, embora seja legítima a necessidade de mudanças em diversos aspectos estruturais, parte da população brasileira tende a não valorizar as conquistas já alcançadas no país, passando a enaltecer tudo o que é considerado superior em outras nações. Essa postura acaba por reforçar o chamado “complexo de vira-lata”, alerta estudo.

 

A esperança do brasileiro foi outro ponto destacado pelo projeto. Apesar dos persistentes desafios históricos, os brasileiros ainda têm expectativa de que um dia, o Brasil será melhor. A pesquisa revelou também uma tendência de mudança no significado dessa esperança, saindo da ideia de promessa de transformação para a de um país protagonista no cenário mundial.

Entre os atributos positivos do país, os entrevistados apontaram a potência socioambiental; a  simbiose entre o território, as pessoas e as culturas; a habilidade na diplomacia, a capacidade de diálogo e força da ação coletiva, demonstrada em momentos de tragédia ou na organização de trabalho cooperativo.

Outros exemplos que reforçam a compreensão de que o país “já é”, em vez de “um dia será”, são os alguns projetos e espaços de excelência, como o SUS, tecnologias financeiras como o PIX, os biocombustíveis e o uso de matrizes energéticas sustentáveis. 

A pesquisa também apresentou recomendações estratégicas para a COP 30. Os especialistas destacaram que a COP 29 gerou um sentimento generalizado de decepção e falta de compromisso por parte da comunidade internacional. Nesse contexto, o Brasil terá em 2025 uma oportunidade decisiva de liderar uma “COP da virada”, capaz de responder de forma concreta e urgente à crise climática. 

Entre o protagonismo global e o complexo de vira-lata

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