Uerj anuncia cortes em auxílios estudantis

Uerj anuncia cortes em auxílios estudantis

Mudanças podem colocar em risco a continuidade da política de inclusão na Universidade, dizem alunos

Por Samira Santos, Julia Lima e Beatriz Araujo

 
 
 

A Pró-reitoria de Políticas e Assistências Estudantis (PR4) da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) anunciou na tarde de quinta-feira (25) uma série de alterações em seus critérios de elegibilidade de bolsas e auxílios para a comunidade universitária. Entre as novas medidas estão a reformulação do Auxílio Material Didático (AMD), o fim do auxílio alimentação para estudantes do campus Maracanã e a redução do valor da renda necessária para alunos de ampla concorrência receberem a Bolsa de Apoio à Vulnerabilidade Social (BAVS). As mudanças geraram preocupações e indignação entre os alunos, que se movimentam para organizar um ato contra as novas regras.

 

Entrada da Uerj no portão 5 (Foto: Agência Brasil)

 

 

Uma das principais mudanças está no Auxílio Material Didático (AMD) que consiste no apoio financeiro destinado à aquisição de material didático para alunos do Instituto de Aplicação Fernando Rodrigues da Silveira (CAp-Uerj) e dos cursos de graduação. O valor de R$ 600, antes pago em parcela única por semestre letivo, passa a ser anual, podendo ser pago em parcelas de R$ 300 ou menos, dependendo da disponibilidade orçamentária.

A implementação da tarifa zero no Restaurante Universitário (RU) anunciada no começo da semana, apesar de ser uma tentativa de melhoria na rotina dos estudantes cotistas, gerou controvérsias devido ao anúncio da suspensão do Auxílio Alimentação aos alunos dos campi Francisco Negrão de Lima (Maracanã) e Instituto Politécnico do Rio de Janeiro (IPRJ). A decisão diz que só poderão optar pelo recebimento de Auxílio Alimentação estudantes cujos cursos tenham sede em campi que ainda não possuam Restaurante Universitário. A tarifa zero, porém, não se estende aos alunos que ingressaram por ampla concorrência e nem aos que recebem BAVS, sendo assim, esses estudantes deverão arcar com os custos de alimentação.

A Bolsa de Apoio à Vulnerabilidade Social, oferecida a alunos ingressantes por ampla concorrência que tenham comprovada a sua situação de baixa renda, também sofreu reformulações. A renda familiar per capita para elegibilidade, antes no valor de um salário mínimo e meio, foi reduzida para valor igual ou inferior a meio salário mínimo (R$ 706). Alunos da ampla concorrência com renda superior a esse limite não terão direito aos auxílios estudantis. 

A Reitoria, liderada pela reitora Gulnar Azevedo e pelo vice-reitor Bruno Deusdará, justificou essas mudanças como uma resposta às restrições orçamentárias pós-pandemia, ressaltando a necessidade de equilibrar investimentos em equipamentos, bolsas e políticas de assistência. 

 

Reações da comunidade acadêmica

O Ato Executivo de Decisão Administrativa 038/2024, que formaliza essas mudanças, entra em vigor em 1º de agosto.

Estudantes e membros de movimentos sociais acusam a Reitoria de “Destruir a política de assistência estudantil da Uerj, que um dia foi um exemplo de inclusão e suporte aos alunos”. “Eles estão acabando com a nossa universidade”, desabafaram nas redes sociais.  A sensação de desamparo é a principal reclamação, e muitos consideram registrar queixas formais para tentar reverter essas decisões. 

Em resposta às novas regras, um ato estudantil foi marcado para o dia 26 de julho, às 16h na Uerj. Intitulado “Tira a mão dos meus direitos!”, a manifestação reunirá estudantes da ampla concorrência, cotistas da graduação e pós-graduação com o objetivo de protestar contra os cortes nos auxílios e bolsas e exigir a revogação das medidas estabelecidas pela PR4 e pela atual Reitoria da Universidade.

 Projeto Quilombo Cuidar realiza terceiro seminário na Uerj 

 Projeto Quilombo do Cuidar realiza terceiro seminário na Uerj 

O projeto de extensão  discutiu  questões com foco na saúde da mulher negra

Por: Maria Eduarda Galdino

Estudantes de enfermagem e integrantes do Quilombo cuidar (Foto: agência Garagem 293)

 

“É cuidar dos outros para além da doença”, essas foram as palavras da estudante de enfermagem da Uerj Thayssa Vitoria Mattos da Silva sobre o Quilombo do Cuidar, projeto de extensão da Faculdade de Enfermagem (FACENF/ Uerj), criado pela professora Roberta Geórgia, coordenadora de graduação da FACENF.  O projeto tem por objetivo cuidar da saúde da população negra e quilombola e expor pautas antirracistas para um público de todas as idades, com aulas e eventos. 

A terceira edição do seminário Quilombo do Cuidar aconteceu no dia 12 de junho, tendo como foco principal a discussão sobre saúde mental da mulher preta. O evento contou com a participação de artistas, enfermeiras, assistentes sociais e professores.

Nas mesas de debate, cada palestrante contou sobre seus projetos, dissertações acadêmicas e vivências como mulheres negras. As histórias relatadas abordaram os obstáculos de viver em sociedade como pessoa negra e como a qualidade de vida e saúde mental são difíceis de se manterem estáveis por conta das violências e falta de suporte do Estado. Mas, apesar das dificuldades contadas, cada palestrante mostrou alternativas de como a comunidade negra pode se ajudar e cuidar, por meio de movimentos que têm como propósitos a coletividade, resistência e o cuidado.

Palestrantes do seminário (Foto: agência Garagem 293)
 

Helaine Maria, uma das palestrantes, falou sobre a sua vivência como enfermeira, que diariamente cuida de pessoas negras que sofrem violência, racismo e abandono nas clínicas de saúde. “Eu recebo essas mulheres lá na maternidade,  muitas delas  em situação de rua que vêm para parir, então como a gente olha essa mulher ? Qual o cuidado ?”, diz Helaine. 

A enfermeira vê a solidariedade e o cuidado como alternativas para a mudança do cenário de violência. Ela afirma que é preciso lutar, escrever, brigar e se unir para combater as violências vividas por mulheres negras. 

 A estudante de enfermagem Thayssa Vitoria, que está no segundo período do curso e que faz parte do projeto de extensão Quilombo do cuidar, contou a experiência dela como mulher negra e como eventos como o seminário são de extrema importância para a sociedade. “Se a Thayssa de 15 anos tivesse frequentado um evento desse, teria me poupado muitos anos de terapia e sofrimentos. É uma questão de representatividade, nesse evento a gente consegue se identificar e perceber que a gente não está sozinha nesse mundo”. 

A estudante ressalta que as mulheres negras ainda não alcançaram posições de protagonismo suficientes. Thayssa afirma que ainda faltam espaços voltados para pessoas negras, que tentam mascarar uma ideia de inclusão, quando na verdade, as mulheres negras ainda não estão presentes nos cargos de protagonismo e de liderança na sociedade. “Quantas médicas pretas você conhece ? Quantas juízas e advogadas pretas você conhece? Quantas coordenadoras de graduação e professoras de mestrado pretas você conhece? Por que não dar o poder a uma mulher negra? A gente ainda tem muito a conquistar e avançar, é uma luta que a gente não vai abrir mão”.

Mais informações  sobre o Quilombo do Cuidar podem ser acessadas nas redes sociais do projeto:  @quilombodocuidar 

Patrocinadores: @uerj.oficial @Fenf_uer  @Prefc_smsrio @socioedunaras @liasmeuerj @procriaruer 

 

 

  

Programa Procriar: Promovendo saúde e conhecimento


Programa Procriar: Promovendo saúde e conhecimento

Programa de extensão da Uerj oferece práticas integrativas e oficinas de criação para a comunidade

Por Samira Santos e Julia Lima

Equipe do Procriar / Foto: Reprodução do Instagram

Na Faculdade de Enfermagem da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), um programa de extensão vem promovendo uma abordagem nova na educação e no cuidado com a saúde. Coordenado por Eliane Paquiela, combina práticas integrativas e oficinas de criação, oferecendo uma experiência educacional e terapêutica única para alunos e comunidade. 

Fundado há mais de duas décadas pela professora Célia Caldeira Fonseca Kestenberg, o Procriar teve continuidade com Janaina Mengal Gomes Fabri e Frances Valeria Costa antes de Eliane assumir a coordenação. O programa é multiprofissional e aberto, favorecendo a interação entre diversos projetos de extensão junto com a comunidade.

O Procriar possui duas frentes principais: as práticas integrativas e as oficinas de criação. As práticas integrativas são coordenadas por professores cadastrados e incluem um projeto abrangente chamado “Saúde-se”, que oferece atendimentos à comunidade e diversas terapias integrativas. Além disso, projetos como “Meditação”, a “Liga da Saúde Mental” e o “Quilombo do Cuidar” são partes do Procriar, abordando temas de dança, arte, cultura, raça, gênero, identidade e sexualidade. Essas iniciativas proporcionam aos alunos a oportunidade de explorar essas temáticas de forma prática que vai além de estudar os conceitos na sala de aula. Paquiela destaca a importância de vincular a comunidade à Universidade através dos projetos de extensão. “A gente acredita que uma formação em saúde não é afastada do campo político, com isso pensamos em oportunizar para que a sociedade possa conhecer a Uerj a partir dos nossos projetos.” 

A relação entre a comunidade e o Procriar é um aspecto essencial do programa. Para que um projeto seja caracterizado como extensão, é necessário que haja uma conexão concreta entre a universidade e a comunidade. Isso é facilitado pela Rede 2.2, que organiza o território de saúde no Rio de Janeiro, permitindo a abertura de espaços tanto para os trabalhadores da saúde quanto para a comunidade local. A divisão territorial da cidade em áreas de planejamento e programáticas permite que os serviços de saúde atendam melhor às necessidades locais, seguindo a lógica organizacional do SUS.

Com a nova gestão da Faculdade de Enfermagem, foi criado um colegiado representando todos os departamentos: Fundamentos de Enfermagem, Enfermagem de Saúde Pública, Enfermagem Médico-Cirúrgica e Enfermagem Materno-Infantil. Esse colegiado inclui dois professores de cada departamento, um ligado às práticas integrativas e outro às oficinas de criação. Com essa estrutura, a Faculdade pretende organizar um cronograma anual para melhorar a gestão e a eficácia dos projetos de extensão. 

O Procriar não apenas beneficia a comunidade com suas práticas integrativas e oficinas de criação, mas também oferece aos alunos uma formação completa, integrando conhecimentos teóricos e práticos. Ele reside no endereço Boulevard 28 de Setembro, 157 – Vila Isabel, Rio de Janeiro – RJ, CEP 20551030

Após completar 96 anos, Verde e Rosa está cada vez mais próxima da população do Morro da Mangueira

Após completar 96 anos, Verde e Rosa está cada vez mais próxima da população do Morro da Mangueira

Carnavalesco da Escola conta a importância da Mangueira para a comunidade

Por: Everton Victor e Manoela Oliveira 

 
 
Quadra da Estação Primeira de Mangueira / Reprodução: Agência Brasil

A Estação Primeira de Mangueira comemorou seu aniversário de 96 anos, no último dia 28 de abril. A Escola celebrou com Rodas de Samba Cultural no Palácio do Samba, com a participação de mangueirenses que marcaram a história da “Verde e Rosa”, como Guesinha, neta do primeiro presidente da Mangueira, e Alvinho, integrante da Velha Guarda da Bateria. Além de comemorar quase um centenário, o objetivo da Escola é estimular “a reunião de seus compositores e convidados para cantar e relembrar os grandes sambas dos mestres do passado”, segundo a agremiação.

O legado quase centenário da Mangueira se estende para além da quadra da Escola, que fica no pé do morro da Mangueira. O Museu do Samba, localizado na Rua Visconde de Niterói, mesma rua da quadra da “Verde e Rosa”, é um retrato da memória do samba. Apesar de não ter vínculo administrativo com a Estação Primeira, reforça seu legado, o espaço conta com três exposições: Heróis da Liberdade, A Força feminina no Samba e Zi Cartola, essa última é dedicada ao legado de Cartola e Dona Zica, que contribuíram para a fundação da Escola em 1928. Para Sidnei França, carnavalesco da Mangueira, como um patrimônio da cidade, o Museu do Samba contribui com seus saberes e seus valores para a comunidade.

Museu do Samba / Reprodução: Everton Victor

De acordo com Amanda Cristina, mediadora do Museu, cada exposição explora um tipo de samba: partido alto, terreiro e enredo. “Nós somos o Museu do Samba, nosso objetivo é salvaguardar esse patrimônio em suas mais variadas vertentes, esses espaços não existem nem de, nem por, nem com, nem para o Carnaval, existe Carnaval sem Escola de Samba e existe Escola de Samba sem o Carnaval”, explica.

Segundo Sidnei França, os artistas e artesãos da agremiação possuem a responsabilidade de formar cidadãos conscientes para a comunidade. A Vila Olímpica da Mangueira foi citada por Sidnei como um dos espaços da Escola que contribui para a formação de talentos e para o desenvolvimento social dos jovens. O local oferece gratuitamente atividades esportivas para todas as idades, como ginástica rítmica, futebol e natação. A Vila conta com a inclusão de turmas para pessoas com deficiência (PCD) em diversas modalidades, esses alunos precisam apresentar o laudo médico antes de se matricular. 

Além de quadras, vila olímpica, viadutos e ruas, a história da “Verde e Rosa” e de seus baluartes também está presente em espaços de preservação da própria comunidade. A Mangueira do Amanhã, Escola Mirim do Pavilhão, Programa Social Mangueira, Mangueira do Futuro, Camp Mangueira e Instituto Profissionalizante Mangueira são alguns dos espaços onde a Estação Primeira expande sua atuação para a comunidade, oferecendo atividades educativas, profissionalizantes, esportivas e sociais. 

O simbolismo da agremiação para o morro também está presente na tradição de valorizar componentes que pertencem à comunidade, que se tornou uma marca d a Escola, como a rainha de Bateria Evelyn Bastos, que está há mais de 10 anos no posto. Evelyn também é presidenta da Mangueira do Amanhã e, mais recentemente, diretora cultural da Liga Independente das Escolas de Samba (Liesa). 

Sidnei França acrescenta que a Estação Primeira possui o objetivo de  desenvolver a cidadania na comunidade, promovendo a cultura e a consciência de pertencimento. “As pessoas da Mangueira precisam saber quem elas são, como elas interagem com o mundo pela produção do samba e da arte”, reforça. Ele afirma que o Morro da Mangueira está em um momento de retomar o protagonismo de seu próprio caminho, surgindo uma geração que enfrenta as dificuldades e os preconceitos. A Escola está criando uma geração que acredita na igualdade, na diversidade e no respeito ao outro, segundo o carnavalesco.

Carnavalesco da Mangueira fala sobre o enredo do Carnaval 2025

Carnavalesco da Mangueira fala sobre o enredo do Carnaval 2025

Escola pretende mostrar as consequências da “diáspora negra”

Por: Everton Victor e Manoela Oliveira

Carro Alegórica da Mangueira de 2020 / Reprodução: Tomaz Silva/Agência Brasil
 
 
 
 
 

A Estação Primeira de Mangueira apresentou seu enredo para o próximo carnaval: “À Flor da Terra – No Rio da Negritude entre dores e paixões”, no dia 25 de abril. No dia 14 de maio, a Escola lançou a sinopse do enredo, próximo ao aniversário de 96 anos da escola. O enredo é assinado pelo carnavalesco Sidnei França, que fará sua estreia à frente da “Verde e Rosa” em busca do 21° título da agremiação. 

Para além de homenagear personalidades negras, o carnavalesco reforçou que busca saudar todo um coletivo. Sidnei quer trazer a história e a riqueza da cultura bantu, e como ela está presente no que hoje se nomeia “Pequenas Áfricas”. Nessa trajetória de África para o Brasil, o carnavalesco também explora o Atlântico como um lugar de memória da própria negritude, como o enredo explica. “A água conduz as passagens e é no seu interior que estão guardadas a memória e os mistérios ancestrais”.

O objetivo do enredo é relatar as consequências da diáspora negra, que consistiu na imigração forçada de africanos durante o período escravocrata. Sidnei declara que deseja levar a cultura bantu para a Avenida, pois 75% dos africanos escravizados eram bantus. Os bantus englobam povos que habitavam principalmente a África Subsaariana, nas regiões de Angola, do Congo e do Gabão. 

Capa oficial do enredo da Mangueira / Reprodução: Instagram da escola

De acordo com o carnavalesco, a Estação Primeira possui uma forte herança preta, sendo uma região que dialoga com a cultura bantu. “A gente pode entender que a Mangueira é uma Pequena África, porque foi ocupada por corpos negros que saíram da região central”, afirma. Por isso, o enredo “À Flor da Terra – No Rio da Negritude Entre Dores e Paixões” consegue trazer o protagonismo negro para a Sapucaí, segundo ele.

Para Sidnei, o enredo não irá prestigiar pessoas específicas ao longo do desfile, mas retratar as vivências de corpos negros na cidade do Rio de Janeiro como um todo. O carnavalesco conta que é preciso não apenas “denunciar o preconceito e a violência, mas também exaltar a cultura preta”. O desfile irá homenagear as contribuições do povo bantu, como suas influências linguísticas, musicais e culturais.  

Sidnei também reafirma o protagonismo negro no desfile, principalmente na construção narrativa. “Esse enredo não vai ser mostrado no desfile segundo a visão colonialista, vamos contar pela ótica e visão preta”. A intenção da agremiação é discutir as diferentes formas de apagamento da população negra, desde sua chegada forçada no Cais do Valongo, explorando a cidade como uma extensão do próprio Atlântico.

No próximo ano, as 12 Escolas de Samba do Grupo Especial serão divididas em três noites de desfiles, nos dias 2, 3 e 4 de março. A Mangueira será a última Escola a desfilar no primeiro dia de desfile. O enredo não apenas homenageia a história da Escola, mas também conta como a alma carioca “desafia a morte, celebra a vida e faz carnaval”. 

O templo do samba contará com 10 das 12 Escolas abordando temáticas afro. Diversos recortes que exploram a negritude já foram anunciados no enredo e na explanação da sinopse. O orixá Logun-Edé, a primeira mulher trans não indígena do Brasil, o cantor Milton Nascimento, o sambista Laíla e o primeiro terreiro de candomblé no Brasil são alguns dos enredos que reforçam a diversidade cultural que será trazida para a Avenida.  

Escritório modelo de advocacia da Uerj oferece atendimento jurídico gratuito para a população do Rio de Janeiro

Escritório modelo de advocacia da Uerj oferece atendimento jurídico gratuito para a população do Rio de Janeiro

Cerca de  540 pessoas foram atendidas pelo escritório em 2023

Por: Maria Eduarda Galdino

Produção: Maria Eduarda Galdino



O escritório modelo de advocacia da Uerj, também conhecido como núcleo de práticas jurídicas, possui um legado de quarenta anos promovendo práticas de desenvolvimento educacional e atendimento ao público. O escritório foi aprovado pelo Conselho Departamental em 1978 para o desenvolvimento das práticas jurídicas dos alunos de advocacia da Uerj e segue até os dias de hoje.

Além do escritório ser um ambiente de prática jurídica dos alunos e advogados em residência, também fornece atendimento de forma gratuita, tanto para os estudantes e funcionários da Uerj quanto para os cidadãos cariocas que se encontram em algum tipo de vulnerabilidade financeira.

Como funciona

O contato com o escritório precisa ser agendado e pode ser feito de três formas: presencial, por telefone e online via e-mail. Após essa etapa, é feito um recorte geográfico para designar o público a ser atendido.

Somente pessoas que possuem tramitação no fórum da capital do Rio de Janeiro podem ser atendidas, esta condição é estabelecida pela própria legislação estadual para que as demandas possam ser cumpridas com qualidade. Quando é solicitado o atendimento, a pessoa passa por uma triagem e abre-se uma ficha de atendimento e o cliente já é encaminhado para algum residente jurídico.

O escritório atende nas áreas Cível, família, inventários, alimentos, divórcios, direitos do consumidor e trabalhista, e também Penal. Matérias como INSS, direito internacional e previdenciário não são atendidas por conta da falta de especialistas nessas áreas.

A coordenadora do escritório, Márcia Michele Garcia, destaca a importância do suporte gratuito à comunidade para o funcionamento da democracia e cidadania. Para ela, quanto mais esse contato é realista e acessível, as relações entre a Universidade e a comunidade externa se fortalecem. Além disso, ela diz que o acesso à educação e formação de qualidade na Uerj se desenvolve a partir de projetos como esse, que utilizam a prática e a realidade para o mercado de trabalho. Sendo assim, alunos de graduação e pós-graduação precisam passar pelo escritório como parte da grade obrigatória do curso de direito.

“São situações que elevam o contato do estudante graduando ou pós-graduando e permitem que esse estudante tenha contato com o dado de realidade que às vezes eles não tem ou não tenham tido pela sua própria experiência de vida, então são situações às vezes muito extremas, que a gente conhece aqui de dor humana, dor economica, dor emocional, dor espiritual, dor de abandono e são muitas experiências que nós podemos vivenciar por aqui, isso facilita que a gente se torne mais e mais humano sem que necessariamente a gente tenha vivido aquela dor”. Relata a coordenadora.

Márcia afirma que os alunos da pós -graduação passam por uma seleção por meio de prova escrita feita pela Uerj, e o escritório recebe os estudantes aprovados, alocando cada estagiário em plantões definidos. Já os graduandos têm a obrigação de passarem pelo escritório, porque de acordo com o projeto pedagógico do curso de direito associado ao estatuto da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) é primordial que o aluno de direito passe pelo estágio obrigatório depois de cumprir três quintos do curso, isto é, dois anos.

Nesses dois anos o aluno passa por uma prova oral com uma banca avaliadora que determina a aptidão ou inaptidão do estagiário. Caso o estudante seja apto, a coordenadora assina o certificado que é enviado e chancelado pela OAB. Ela ressalta que essa prova não é determinante para a conclusão do curso e sim uma avaliação de desempenho, e que o aluno pode recorrer a outro exame caso seja reprovado. 

Desenvolvimento e suporte

O escritório passou por várias mudanças estruturais ao longo dos anos, principalmente a partir de março de 2023. Neste ano, as bolsas voltaram a ser disponibilizadas para os  residentes que retornaram para o NPJ (Núcleo de Prática Jurídicas) sob a coordenação do professor e advogado Daniel Queiroz, depois de 8 anos sem residentes devido à crise financeira no Estado do Rio de Janeiro em 2016. 

A partir da reabertura dos atendimentos, 540 pessoas já foram atendidas e a infraestrutura do escritório começou a se modernizar com a criação de um auditório, sala de mediação e recursos tecnológicos para a digitalização do acervo do escritório que antes era cem por cento físico e ocupava o que hoje é o auditório. Parte dos materiais foram comprados através da própria verba da direção da Faculdade de Direito e outros recursos foram custeados pela Uerj.

Em 2022, o escritório desenvolveu recursos tecnológicos como o PID (Ponto de Inclusão Digital) apoiado pelo Conselho Nacional de Pesquisa, que é um convênio que fornece aparatos tecnológicos para a realização de chamadas de vídeo para audiência, mediações e visualização no andamento de processos via internet, mesmo que a pessoa não esteja sendo acompanhada pelo escritório. O objetivo desse convênio é promover a inclusão digital das pessoas em vulnerabilidade social.

Outro ajuste estabelecido em 2022 foi o PASCE (Polo Avançado de Solução de Conflitos Extrajudiciais), um convênio que a Uerj firmou com o Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. E através desse convênio, foi inaugurado um espaço de solução consensual, também chamado de sala de reunião de mediação, onde acontecem mediações judiciais antes da abertura de uma ação judicial. Os conflitos apresentados aos advogados do escritório passam por uma tentativa de solução para o desacordo.

Grande Tijuca é líder em perda populacional na cidade do Rio de Janeiro

Grande Tijuca é líder em perda populacional na cidade do Rio de Janeiro

Principal causa apontada por especialista foi o aumento do custo de vida na região

Por: Manoela Oliveira

Parque Nacional da Tijuca / Reprodução: IStock



A Zona Norte sofreu um esvaziamento populacional, de acordo com dados do Censo de 2022, compilados pelo Instituto Municipal de Urbanismo Pereira Passos (IPP). Entre 2010 e 2022, a Tijuca e Vila Isabel foram os bairros com as maiores perdas de população, com a diminuição de 21.479 e de 20.228 habitantes, respectivamente. Segundo o estudo, o Alto da Boa Vista foi o único bairro da Grande Tijuca que aumentou o número de moradores, havendo um acréscimo de 488 habitantes. 

De acordo com o IPP, os cinco bairros do Rio de Janeiro que receberam mais moradores estão todos localizados na Zona Oeste, são eles: Jacarepaguá (66.685), Recreio dos Bandeirantes (59.076), Guaratiba (46.756), Santa Cruz (31.797) e Itanhangá (29.554). O estudo comprovou uma perda populacional no Centro e na Zona Sul, porém em números menores comparados com a Zona Norte. 

Para Vitor de Pieri, professor do Instituto de Geografia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), o aumento do preço dos aluguéis é uma das causas do esvaziamento da Zona Norte. Ele explicou que: “A população acaba migrando em função de obter melhores condições de moradia a partir do valor do aluguel”. O professor afirmou que isso ocorre devido à gentrificação, que consiste na supervalorização de uma determinada área, acarretando um aumento no custo de vida naquela região.  

Vitor disse que os antigos moradores da Zona Norte estão se instalando em condomínios irregulares na Zona Oeste, como em Santa Cruz, por serem locais com terrenos mais baratos. Ele afirmou que: “O problema desse processo é que sobrecarrega o poder público”. O professor da Uerj citou a Lei 10.257, denominada Estatuto da Cidade, como uma forma do governo atuar nos diferentes pontos da cidade. Essa lei é responsável pelo planejamento urbano, atuando na organização espacial da população.  

Em variações percentuais, Turiaçu foi o bairro com o maior êxodo urbano, com a diminuição de 32,7% dos moradores, de acordo com o Censo. A perda de 5.633 habitantes pode ser explicada devido à remoção de famílias na região para a construção do Parque Madureira, segundo Vitor de Pieri. A fronteira entre Turiaçu e Madureira sofreu um esvaziamento, porque a comunidade Vila das Torres foi retirada para a construção do parque em 2010. 

O professor ressaltou que cada bairro da Zona Norte possui uma causa específica para a diminuição populacional, porém motivos como a gentrificação, as territorialidades do crime organizado, a escassez de políticas públicas e a falta de divulgação do Censo são essenciais para entender o porquê disso ocorrer.

Camorim, em variações percentuais, foi o bairro com o maior ganho de moradores, com o aumento de 137%, segundo a pesquisa do IPP. Localizado no distrito da Barra da Tijuca, o bairro recebeu 2.699 habitantes entre 2010 e 2022. Para Vitor, o Recreio e a Barra da Tijuca são lugares de fuga da classe média e das elites cariocas. O Relatório de Compra e Venda de 2024 revelou que a Barra da Tijuca foi o local mais procurado para a compra de imóveis, seguido do Recreio dos Bandeirantes em segundo lugar.  

Vitor explica que Jacarepaguá, bairro que mais ganhou moradores em números absolutos, também é um local de fuga das elites, por essa classe buscar condomínios fechados. Por outro lado, de acordo com ele, Jacarepaguá possui um lado popular que atende às necessidades dos ex-habitantes da Zona Norte. Jacarepaguá é o quarto bairro com maior dimensão territorial no Rio de Janeiro, facilitando o deslocamento populacional para essa região. 

Jorge Artur, presidente da Associação de Moradores e Comerciantes de Vila Isabel, acrescentou que a busca por condomínios foi um fator central para entender a saída de pessoas da Grande Tijuca. Ele disse que: “Os empreendimentos que existem aqui, em Vila Isabel, não são iguais aos que existem na Zona Oeste, porque os terrenos são mais limitados”. Pois, segundo o presidente da associação, a Zona Oeste teria uma vantagem na dimensão territorial. 

A Zona Norte sofreu um aumento nas taxas de criminalidade nos últimos anos. De acordo com levantamentos do Instituto de Segurança Pública (ISP), os furtos aumentaram quase em 100% nos bairros da Grande Tijuca em 2022. Os roubos, no estudo do mesmo ano, tiveram um acréscimo em quase 50%. Porém, para Jorge, “a criminalidade está em toda parte”. Por isso, o aumento do crime não seria o único motivo para explicar o esvaziamento da Zona Norte, segundo ele. 

Jorge Artur afirma que a associação de moradores é responsável por 19 projetos sociais e atende cerca de 400 pessoas, mas ainda é necessária a implementação de políticas públicas na região para evitar o deslocamento dos habitantes para outras partes da cidade. Ele cita os roubos no entorno da Uerj e a formação de comunidades de moradores de rua no Maracanã como situações que precisam da atuação da Prefeitura e do Governo do Estado do Rio de Janeiro. “Tudo isso contribui para que tenha uma população tentando migrar para lugares que julgam ser seguros”, conclui Jorge. 

Associação de Moradores e Comerciantes de Vila Isabel / Reprodução: Facebook




Jorge destacou o papel da associação de moradores no apoio às comunidades da Grande Tijuca. “Precisamos fazer nossa parte para ter um mundo melhor”, ele reforça. A Associação de Moradores e Comerciantes de Vila Isabel foi responsável pela retirada de 85 caminhões de lixo no prédio onde está a atual sede da associação, além de desenvolver outros projetos sociais na área da saúde e da educação. Jorge pontuou que: “Foi a união de várias pessoas que quiseram fazer o melhor”. 

 
 
 
 
 

Milhões de brasileiros se preparam para as eleições municipais de outubro

Milhões de brasileiros se preparam para as eleições municipais de outubro

A eleição irá determinar os prefeitos, os vice-prefeitos e os vereadores das 5.568 cidades brasileiras

Por: Manoela Oliveira

Reprodução: Pixabay

Em 6 de outubro, cerca de 152 milhões de eleitores participarão da eleição municipal para decidir os vereadores, os prefeitos e os vice-prefeitos de todo o Brasil. De acordo com o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), caso nenhum candidato consiga metade dos votos válidos em cidades de mais de 200 mil eleitores, o segundo turno ocorrerá em 27 de outubro.

A Lei das Eleições permite o registro de candidatos e de candidatas pelas coligações e pelos partidos políticos até 15 de agosto. O atual prefeito da capital, Eduardo Paes (PSD) pretende se reeleger com o apoio do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Na eleição de 2020, Paes obteve 64,7% dos votos no segundo turno, derrotando o seu concorrente, o então prefeito Marcello Crivella. Paes foi o candidato preferido em todas as zonas eleitorais neste turno, segundo o TSE.

Mapa de apuração das eleições municipais de 2020 / Reprodução: Manoela Oliveira

Na última eleição para prefeito, Paes disparou na região da Grande Tijuca do Rio de Janeiro. De acordo com o TSE, na 229º e na 170º zonas eleitorais, localizadas no Maracanã, ele obteve 75,92% e 77,93% dos votos, respectivamente. Paes também alcançou 78,33% dos votos na Tijuca e conseguiu atingir cerca de 140 mil votos nessas três zonas eleitorais. O atual prefeito é uma aposta para a eleição de 2024, especialmente na Grande Tijuca.

Outros candidatos como Tarcísio Motta (PSOL), Alexandre Ramagem (PL), Cyro Garcia (PSTU), Pedro Duarte (Novo) e Otoni de Paula (MDB) são cotados para concorrerem na disputa eleitoral pela Prefeitura do Rio. Dani Balbi (PCdoB), Marcelo Queiroz (PP) e Juliete Pantoja (UP) também são nomes esperados para a disputa do cargo.

Para os políticos que pretendem ser vereadores, a data-limite para trocar de partido sem a perda do mandato foi 5 de abril. Porém, assim como os candidatos à Prefeitura, eles têm até 15 de agosto para registrarem a candidatura.

Os cidadãos com idade entre 18 a 70 anos são obrigados a votar nas eleições. O voto facultativo é para pessoas com mais de 70 anos, para os analfabetos e para os jovens com idades entre 16 e 18 anos. Segundo o TSE, o prazo para emitir e regularizar o título eleitoral é até o dia 8 de maio.

O TSE disponibiliza atendimento remoto para realizar o alistamento eleitoral e a regulamentação do título de eleitor.

Ganhadores do Prêmio Nobel marcam presença na Uerj

Ganhadores do Prêmio Nobel marcam presença na Uerj

Palestras promovem diálogos entre cientistas internacionais e nacionais 

Por: Manoela Oliveira e Maria Eduarda Galdino

Da esquerda para a direita: May-Britt Moser, Luiz Davidovich, Isaac Diaz, Heloísa Paterno, Lúcia Del Valle e Adam Smith / Reprodução: Manoela Oliveira
 
 
 

A Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) reuniu três ganhadores do Prêmio Nobel para debaterem sobre a importância da ciência, nesta última segunda-feira (15). O evento aconteceu pela primeira vez no Brasil, e trouxe premiados como Serge Haroche (ganhador do Prêmio Nobel de Física),  David MacMillan (ganhador do Prêmio Nobel de Química) e May-Britt Moser (ganhadora do Prêmio Nobel de Medicina). O encontro foi organizado pela Academia Brasileira de Ciências (ABC) e pelo Nobel Prize Outreach. 

A palestra “As responsabilidades dos cientistas” discutiu o papel dos cientistas no incentivo à ciência e na construção de um futuro melhor, no Teatro Odylo Costa, filho. A mesa contou com a presença de May-Britt, de Luiz Davidovich, ex-presidente da ABC e de Adam Smith, moderador do debate. Alunos de universidades da América Latina foram convidados para participarem do debate. Lúcia Del Valle, da Universidade do Chile, Isaac Diaz, do Instituto de Tecnologia da Costa Rica e Heloísa Paterno, do Instituto Federal Catarinense, relataram suas experiências como jovens cientistas.

O evento iniciou-se às 10h00 e terminou às 16h00, promovendo uma discussão sobre a importância dos cientistas na sociedade. A cobertura em inglês e em português do evento pode ser acessada pelo Youtube do Nobel Prize.

As responsabilidades dos cientistas

Luiz Davidovich explicou que a obrigação dos cientistas é buscar conhecimento, visando desenvolver um mundo melhor. Segundo o físico: “A ciência deveria ter como preocupação principal a curiosidade e a paixão pela mesma”. Ele ressaltou a pressão da nova geração de cientistas com o “sistema recompensatório”, que consiste na extrema vontade dos pesquisadores de serem reconhecidos pelas suas pesquisas acadêmicas. Porém, de acordo com Davidovich, o trabalho dos cientistas de desvendar os mistérios do universo já é algo impressionante, não é necessária a procura por recompensas acadêmicas.

Davidovich disse que a outra responsabilidade dos cientistas é seguir regras éticas, para a ciência não se tornar algo prejudicial à humanidade. Porque, segundo ele: “Geralmente, aqueles que têm mais poderes no país ou no mundo, vão ter mais poder na gestão da tecnologia”. O físico enfatizou que a ciência é um mecanismo para romper barreiras globais, por isso, ela deve ser usada de maneira correta pelos cientistas. A pesquisadora May-Britt acrescentou que em situações de guerra, como no conflito entre Ucrânia e Rússia, os pesquisadores precisam se ajudar para o bem da sociedade.

May-Britt levantou um questionamento sobre o limite do envolvimento dos cientistas nas áreas políticas.  Ela afirmou que: “Ao receber o Prêmio Nobel, as pessoas me tratam, como os outros laureados, como uma pessoa que pode ter influências políticas”. A neurocientista enfatizou que é necessário encontrar um equilíbrio na atuação desses profissionais nas questões públicas, para não ocorrer uma intervenção extrema e se tornar algo perigoso.  Em março de 2024, houve um caso de envolvimento político dos ganhadores do Prêmio Nobel, em que 39 laureados se manifestaram contra o governo de Vladimir Putin, presidente da Rússia, em carta aberta. 

Lúcia Del Valle perguntou a May-Britt como ela lida com profissionais de diferentes áreas nos laboratórios de pesquisa. Como exemplo, Lúcia citou os profissionais de comunicação que ajudam na divulgação dos projetos do laboratório para a população. May-Britt respondeu que a comunicação é fundamental e os cientistas do laboratório sempre procuram estar em constante contato com os comunicadores. A neurocientista ressaltou que não tem medo de receber outros profissionais que saibam mais que ela em alguma área, seja ela científica ou qualquer outra. 

Isaac acrescentou ao que foi dito por May-Britt em relação à comunicação. Ele afirmou que a comunicação é uma responsabilidade pública, porque as instituições usufruem do dinheiro do Estado, portanto existe uma responsabilidade em compartilhar as pesquisas e o desenvolvimento com a sociedade. 

Luiz Davidovich complementou a fala de Isaac sobre a necessidade de se aprender a ouvir as pessoas de diferentes culturas em nossa volta, e não somente compartilhar o seu ponto de vista de pesquisador. Davidovich disse que o Brasil e outros países da América Latina carregam consigo uma diversidade, então os cientistas devem ouvir a perspectiva e conhecimento de cada indivíduo. Como exemplo, ele citou que a ABC possui uma categoria chamada de “colaboradores”, os quais são pessoas que não são cientistas, mas que fizeram diversas contribuições para o avanço científico. O físico citou  Davi Kopenawa, xamã da tribo Yanomami, protagonista de um livro transcrito pelo antropólogo francês Bruce Albert chamado “A queda do céu”. A obra é um relato sobre a história de vida de Davi e suas crenças cosmoecológicas. Luiz acrescentou: “Além da ciência, existe o conhecimento, e conhecimento é diferente de ciência. E nós devemos ouvir o conhecimento, porque o conhecimento pode ser a entrada para a ciência”.

BRASIL X CIÊNCIA 

Apesar de o Brasil ter um certo desenvolvimento no âmbito científico, muitos cientistas brasileiros se sentem desvalorizados no país, pois as instituições de educação e pesquisa científica não recebem apoio suficiente das autoridades públicas. Os cortes nas bolsas, a falta de infraestrutura e a desvalorização do Estado são constantes. Segundo o Centro de Gestão e Estudos Estratégicos, nos últimos anos, 6,7 mil cientistas deixaram o país para poderem iniciar ou concluir suas pesquisas no exterior. 

A falta de pesquisas feitas por brasileiros têm consequências no cenário nacional. O prêmio Nobel é um evento que acontece há 120 anos, desde 1901, e até hoje nenhum brasileiro teve a oportunidade de ser laureado, seja ele nas categorias de Medicina, Literatura, Economia, Paz, Física e Química. 

Diante dessa crise nacional, o governo Lula tem feito esforços para o resgate do avanço científico no país. O programa “Conhecimento Brasil” está sendo lançado visando repatriar cientistas brasileiros que atualmente residem no exterior e tenham concluído o mestrado e doutorado, ou até mesmo cientistas brasileiros que não possuem nenhum tipo de vínculo com alguma instituição científica no país para que eles possam desenvolver suas pesquisas no Brasil. O governo planeja investir 1 bilhão de reais para repatriar mil cientistas brasileiros e combater o que eles chamam de “fuga de cérebros”, termo usado para pesquisadores que se formam em território brasileiro e saem do país. 

O programa irá pagar uma bolsa de R$13 mil reais aos cientistas que ficarem em instituições de pesquisas ou universidades brasileiras, mais uma verba de 400 mil reais para que novos institutos de pesquisa sejam construídos.  

Apesar de o programa “Conhecimento Brasil” ter um plano progressista, ainda surgem inúmeras dúvidas em relação a alguns aspectos. Nas redes sociais, alguns cientistas questionam o programa, alegando que o governo deveria pensar nos cientistas que continuam no país e estão tendo dificuldades devido à desvalorização da profissão.  Segundo relatório de Elsevier-Bolsi, o Brasil registrou uma queda de 7,4% de produção científica em 2022, em comparação com o ano anterior. 

Comentário de um usuário do X na postagem do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) / (Reprodução: X)

Hupe oferece cirurgia de confirmação de gênero para a comunidade transexual

Hupe oferece cirurgia de confirmação de gênero para a comunidade transexual

Urologista do Hupe explica os procedimentos cirúrgicos

Por: Manoela Oliveira e Kauhan Fiaux

Reprodução: IStock
 

O ambulatório de Transdiversidade do Hospital Universitário Pedro Ernesto (Hupe) oferece acompanhamento para pessoas transexuais, transgêneros e travestis do Rio de Janeiro. O ambulatório é registrado pela Secretaria Estadual de Saúde e é um dos pontos de referência no Estado.

O Hupe disponibiliza apoio para as pessoas trans, desde o acompanhamento psicológico e o tratamento hormonal até o procedimento cirúrgico. A cirurgia de confirmação de gênero pode envolver procedimentos genitais ou não genitais (como a mastectomia ou a feminização facial), as cirurgias genitais são apenas uma parte do processo. 

Segundo levantamento da Folha de S. Paulo, apenas oito estados oferecem cirurgias de confirmação de gênero de forma pública. No Rio de Janeiro, apenas dois hospitais disponibilizam o serviço: o Hupe e o Hospital Universitário Gaffrée e Guinle, ambos localizados na capital fluminense. Por mais que o acesso a esse tipo de tratamento tenha aumentado nos últimos anos, a oferta ainda é pequena para a população. Segundo dados da Universidade Estadual Paulista (Unesp) de 2021, cerca de 3 milhões de pessoas no Brasil são trans ou não-binárias, representando cerca de 2% da população do país.

A carência de espaços que realizam o procedimento gera grandes filas de espera, fazendo com que as pessoas optem por fazer a cirurgia em rede privada. Em 2021, a Associação Nacional de Saúde Complementar (ANS) incorporou a cirurgia de confirmação de gênero na lista de procedimentos cirúrgicos liberados para planos de saúde – uma forma um pouco mais barata quando comparada com a saúde privada. Dados dos próprios convênios de saúde indicam que, desde então, o número de cirurgias aumentou em 75%.

Etapas da cirurgia 

Antes da realização da cirurgia de confirmação de gênero, é necessário um tratamento hormonal prévio de dois anos. A pessoa que deseja prosseguir com a cirurgia precisa de um acompanhamento com um endocrinologista para providenciar as transformações corporais masculinas ou femininas. Também é preciso orientação de profissionais como psicólogos, psiquiatras e assistentes sociais, porque eles oferecem suporte emocional para a adaptação da cirurgia. O urologista especializado em reconstrução urogenital do Hupe, Luiz Augusto Westin, diz que: “Uma vez que conseguimos alinhar o corpo e a mente do paciente, começamos a pensar em fazer qualquer procedimento cirúrgico”.

Na transição dos órgãos genitais do feminino para o masculino, existem duas técnicas cirúrgicas ofertadas pelo Hupe: a metoidioplastia e as neofaloplastias. Westin explica que: “A metoidioplastia é uma técnica na qual a gente alonga o clitóris hipertrofiado. É feito uma harmonização e o clitóris cresce”. Nesse procedimento, o paciente consegue urinar sentado e ter relações sexuais, porém não é recomendado o sexo com penetração. 

Segundo o urologista, as neofaloplastias são cirurgias mais complexas que demandam mais etapas. “Isso consome a vida do paciente e eles, muitas das vezes, acabam não optando por essas técnicas”, ressalta Westin. Porém, algumas pessoas escolhem as neofaloplastias por possibilitarem ao indivíduo ter um pênis maior, em comparação com a metoidioplastia. As neofaloplastias são feitas somente em hospitais públicos, porém existem pesquisas em andamento pelo Ministério da Saúde para esse procedimento também ser feito em hospitais de redes privadas, segundo o médico. 

De acordo com o urologista, na mudança da genitália masculina para a feminina, a cirurgia de confirmação de gênero é efetuada por meio da inversão peniana modificada. “É um procedimento mais simples que a metoidioplastia e as neofaloplastias, por ter muito tecido para trabalhar. A gente usa uma parte da pele do escroto para fazer o canal vaginal”, afirma Westin. A cirurgia dura em torno de quatro horas e o paciente recebe alta em cerca de cinco dias. 

O especialista alerta que no processo pós-cirúrgico, alguns problemas médicos podem surgir, sobretudo os que dizem respeito à uretra: “O atendimento médico é eterno. Esses pacientes não recebem alta nunca”. O recomendado por Westin é uma consulta médica anual durante toda a vida para a prevenção de possíveis complicações. 

O urologista ressalta a importância de se ter disponível as cirurgias de confirmação de gênero no Hupe para homens e mulheres trans. Ele acrescenta que: “A saúde é um direito de todos e dever do Estado. Todo mundo tem que ter acesso à saúde”. Westin destaca que a cirurgia de transgenitalização é uma conquista da comunidade LGBTQIA+.

O Hupe fica localizado no Boulevard 28 de Setembro, número 77, no bairro de Vila Isabel. Mais informações podem ser obtidas pelo telefone: (21) 2868-8000